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  1. Herman Faulstich

    True Detective: Iluminação pelas Trevas.

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     "Revela coisas profundas da escuridão e traz à luz densas sombras." 
    Jó 12:22.



    True Detective, o seriado de 8 partes da HBO, me segurou pelo personagem Rust Cohle  (Matthew McConaughey). Um indivíduo inteligente, introvertido, cético, totalmente desiludido da vida em oposição ao parceiro Marty Hart(Woody Harrelson), homem de família, religioso e profissional mediano no interior da Louisiana, região dos pântanos, das superstições católicas e das práticas vodus.


    O seriado se edifica na batida perseguição ao serial killer ritualístico, aqui deixando a sua vítima, uma jovem prostituta, ornada com adereços celtas: chifres de veado, folhas e pintura em espiral. A diferença do roteiro é que se estende por quase vinte anos iniciando em 1995 com a chegada de Rust na cidade até os dias de hoje. Nesse desenvolvimento vemos a diferença marcante entre os parceiros: o ímpio versus o crente, introvertido versus extrovertido, o isolado versus o homem de família no clichê de policiais que se complementam mas não gostam muito de trabalhar um com o outro. Observamos também o quanto a atividade policial cobra dos profissionais, facilmente destruindo lares devido ao contato com o pior da espécie humana aqui mostrado no assassinato e abuso sexual infantil. A iniquidade do mundo revela-se no seu esplendor em crimes envolvendo crianças. Rust torna-se obcecado por desvendar o crime e encontra obstáculo na burocracia do sistema e no vínculo com pessoas influentes que o crime contém, como um religioso responsável por trabalhos sociais com crianças. Com o desenrolar aprendemos que Rust perdeu uma filha, separou-se da esposa e trabalhou infiltrado numa gangue consumindo todo tipo de drogas e o quanto isso tudo contribuiu para a sua via crucis. Depois de anos investigando o crime de forma apócrifa e o conectando a outros assassinatos semelhantes, não suportando a barra, Rust se demite e some da cidade enquanto Hart separe-se da esposa devido a traições cometidas por ele – uma forma de aliviar o peso da profissão policial que a monótona vida familiar não tinha condições de fazê-lo. Ambos conseguem chegar a um dos criminosos e resolvem a situação, mas Rust tem a convicção que existem outros.


      Perversão do paganismo pelo cristão.


    A trama mostra dois períodos de tempo distintos: o passado quando os dois policiais eram parceiros e o presente onde Rust é investigado por crimes semelhantes aos que investiga. Hoje Rust é um eremita, pulando de emprego em emprego, amortecendo-se no álcool, um homem degradado e Marty trabalha como detetive particular divorciado da esposa e longe das filhas, mas como uma vida confortável - a razão pela qual ele abandona a polícia também é indigesta. Após se encontrarem novamente, Rust convence Marty a ajuda-lo a continuar atrás dos criminosos, pois durante os anos separados, ele encontra uma forte evidência: uma fita de vídeo mostrando assassinato de uma das crianças. Em trajes que remetem entidades pagãs da natureza, os participantes, antes de matar a menina, abusam sexualmente – isso não é mostrado, mas podemos perceber pela reação de Marty ao assistir. Ambos então continuam a investigação, usando métodos tradicionais de investigação (nada da pirotecnia forense de muitos seriados atuais) chegam ao verdadeiro executor dos assassinatos. Também outro clichê: o caipira que mora isolado e coabita com uma irmã doente mental vivendo num pardieiro - o caos externo que reflete o interior do vilão. 

     Rust: homem de pouca fé.


    Rust sai em perseguição ao vilão através do matagal que cerca a casa chegando em uma grande construção abandonada. Ele desce ao inferno atrás do diabo. O local é como um labirinto: inúmeras entradas que levam a outras, em um cenário de paredes de tijolos envelhecidos, roupas e panos velhos, folhas e galhos secos ao redor; a degradação da natureza –  tão degradação quanto a ritualística utilizada pelos assassinos pervertendo cultos silvestres primitivos e pelo uso de crianças. O vilão vai chamando Rust cada vez mais para dentro do submundo expressando-se de forma religiosa ao justificar os próprios pecados. Chegando ao salão principal, a câmera nos exibe uma abertura no alto que deixa amostra o céu, servindo como prenúncio para um evento divino – não é a toa que Rust veste camisa branca, como se também predissesse purificação. Ao caminhar pelo salão depara-se com ossadas e, olhando para uma parte escura do local, tem uma visão.  Hipnotizado pelo evento ele fica a mercê da besta que, emergindo das trevas, o ataca. É salvo  pelo parceiro após levar uma facada no abdômen permanecendo na fronteira entre a vida e  morte. Posteriormente no hospital ambos conversam e Rust se abre contanto a visão: 

    Teve um momento quando eu estava na escuridão, a que quer que eu tenha me reduzido, não era em consciência, era uma lucidez vaga na escuridão, pude sentir minhas definições se desvanecendo. E por baixo dessa escuridão havia uma de outro tipo. Era mais profunda e confortável, como uma substância.


    Eu pude sentir, cara. E eu sabia que a minha filha estava me esperando lá. Pude sentir uma parte do meu pai também. Era como se fosse parte de tudo o que amei, e estávamos todos os três... desvanecendo. Tudo o que eu tinha que fazer era seguir em frente. E segui.


    Eu disse: “Pode vir, escuridão”. E desapareci. Mas eu ainda podia sentir... o amor dela...mais forte do que antes. Não tinha nada além daquele amor. E então eu acordei.



    Aquele que combate monstros deve tomar cuidado para que não se torne um. E quando se olha para o abismo, o abismo olha para você. Friedrich Nietzsche


    A série toda é permeada pelo religioso: o local de cultura católica que permite muito mais superstições do que a protestante, a ritualística degradada de cultos primitivos pela ótica dos cristãos pervertidos, o envolvimento nos eventos do religioso dono de obras sociais, o discurso do assassino dentro do labirinto, as tomadas da imensidão geográfica apequenando o homem e claro, a epifania do herói que se auto-imolou cristicamente durante anos - até a sua aparência no presente lembra Jesus Cristo. Foi uma experiência tão sublime que ele muda de posição como expresso no diálogo final com o parceiro ao lembrar o quanto fitava as estrelas na juventude:


    Rust: Só existe uma história, a mais antiga de todas: luz versus a escuridão.

    Marty: Bem, sei que não estamos no Alasca, mas me parece que a escuridão tem mais território.


    Rust: Você está percebendo errado o lance sobre o céu.


    Marty: Como assim?


    Rust: Antigamente só existia a escuridão. Na minha opinião a luz está vencendo.


    Se Paulo de Tarso prendeu-se na imagem, dogmatizando uma experiência divina, Rust compreendeu o verdadeiro significado da metanoia; ele não foi religioso, mas místico. Rust mergulhou fundo na escuridão dedicando toda a sua vida a jornada espiritual em direção às trevas ao continuar investigando um caso perdido por anos, lidando com situações desagradáveis com grande probabilidade de impunidade. Aliás, outros membros do culto não foram presos, mais especificamente, o tal religioso das obras sociais. Esta, definitivamente, não foi uma história de caça ao serial killer.

    O nome da série é no singular e não no plural pois referiu-se ao Rust, aquele que combateu monstros, não tornou-se um e purificou-se ao olhar para o abismo que existe no homem. Ser policial é uma profissão ideal para isso.
  2. Herman Faulstich

    Inspirações em Quadrinhos – Parte II: Steve Englehart e o Doutor Estranho (um mago muito melhor do que John Constantine)

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    Steve Englehart é um escritor estadunidense, formado em psicologia, que enveredou por várias personagens de quadrinhos (Batman, Capitão América, Vingadores, Liga da Justiça citando alguns) sendo um dos mais profícuos autores do meio nos anos 70 e 80. Foi indicado a vários prêmios da indústria de quadrinhos ganhando o Eagle Awards como melhor escritor em 1978 entrou para o rol da fama do Eagle.


     Steve Englehart


    Conheci a prosa de Englehart nas estórias do Doutor Estranho em Super Aventuras Marvel. O Doutor era um cirurgião arrogante chamado Stephen Strange que, após um acidente que deixou suas mãos inúteis para prosseguir na profissão, saiu pelo mundo atrás da cura e foi parar no Tibete. Lá conheceu um mestre místico, na batida imagem do velho oriental, chamado de Ancião que o aceitou como discípulo. Após o treinamento de anos tornou-se o melhor aluno do sábio e saiu pelo mundo combatendo as forças do mal em magia. Voltado mais para as aventuras de fantasia, em oposição ao pseudo realismo popularizado de Hellblazer da Vertigo(1), sendo mais conhecido da geração atual, o Doutor viajava entre dimensões no seu corpo astral enfrentando seres demoníacos e encontrando entidades cósmicas como Pesadelo, o senhor do mundo dos sonhos, o Tribunal Vivo, uma entidade onipotente responsável por manter o equilíbrio da realidade e a Eternidade, a personificação do universo.

     Doutro Estranho encarando a Eternidade. Por Steve Ditko.


    Possuí um manto de levitação e um artefato chamado Globo de Agamotto (as vezes 'olho') que lança rajadas de energia, dissipa ilusões dentre qualquer outra necessidade do autor da aventura. Criado por Stan Lee e desenhado por Steve Ditko em 1963, o Doutor Estranho tem como características realizar mudrás (2) na hora de fazer seus feitiços e dizer o nome dos encantamentos numa terminologia fantástica como ‘Faixas de Cyttorak’ e ‘Escudos de Serafin’ – o criador disse que os hippies dos anos 60 adoravam o personagem e buscavam leituras subentendidas nas estórias, mas nada havia de mais ali; era apenas diversão por parte dos autores.


    Dr. Estranho na sua forma astral e fazendo o mudrá do capeta nos anos 60...


    ...que aprendeu com o seu mestre, O Ancião. Por Steve Ditko.
     
    Englehart assumiu as aventuras do mago em 1973 graças a indicação de um desenhista cabeludo do Brooklyn chamado Frank Brunner que andava por aí com livros de Carlos Castaneda e H.P. Lovecraft. Na verdade Brunner havia saído do título, pois o escritor, o veterano Gardner Fox, não estava se empenhando muito nas estórias. Após Fox deixar a revista, o editor Roy Thomasquis trazer Brunner de volta e este, por sua vez, indicou para escrever um cara que ele conversou em algumas festas sobre cabalá, astrologia e satanismo. A parceria foi profícua e os dois se reuniam bimestralmente na casa de cada um para jantar e ficavam até as 4 da manhã conversando sobre o personagem, tomando LSD e viajando no filme de Charles Bronson, 'Desejo de Matar'. Quando não estavam em suas casas, saiam com Jim Starlin e outro colegas para tomar mais LSD, vagar por Manhattan e trocar ideias sobre a vida o universo e tudo mais.

    Frank Brunner: Desejo de Matar com LSD.


    A primeira aventura deles que li foi em Super Aventuras Marvel n°6. Produzida em 1974, conta a história do Dr. Estranho enfrentando um demônio chamado Shuma Gorath que tomou o corpo do Ancião. No decorrer o doutor percebe que não tem outra alternativa senão matar o próprio mestre para derrotar o inimigo.  Após o feito torna-se o Mago Supremo da nossa realidade, mas fica inconsolável e pensa em renunciar a magia e segue o diálogo abaixo: 

     Um mestre ascencionado. Arte de Frank Brunner.

    Percebemos então que, após o discípulo matar o ego do mestre, este se torna uno com o universo. ‘Quando o discípulo está pronto, o mestre desaparece’ é um dos ditados famosos dos praticantes de magia. Esta passagem é carregada de referências as disciplinas orientais de desapego da matéria em prol da evolução da consciência.


    Nas edições 10 e 11 da mesma revista, o Dr. Estranho enfrentou um mago do século 31 chamado ‘Siseneg’ (anagrama de ‘Gênesis’) que volta no tempo para absorver a energia mística que era fraca na sua era. Tem como plano recriar o universo de acordo com a própria concepção assumindo o lugar do deusjudaico-cristão. À medida que volta no tempo ele age como o referido deus agia na história humana até chegar ao início de tudo e ali descobre que o seu objetivo era impossível, pois existia um poder superior e perfeito (que o autor não chamou de ‘Deus’). Então Siseneg, em seu estado elevado, divaga sobre o plano cósmico da espécie humana evoluir longamente até tornar-se algo divino. Ciente disso refaz toda a criação como era antes de modifica-la e desaparece. 


     Siseneg: "Não há deus senão o homem". Arte de Frank Brunner.

    Englehart criou Siseneg após uma conversa com os colegas de profissão Jim Starlin e Alan Weiss debaixo de uma cachoeira quando discutiam sobre Deus.

    Depois na edição 15 de Super Aventuras Marvel Stephen Strange enfrenta mais um desafio, só que agora, literalmente mortal. Preso dentro do Globo de Agammotto por um ex-cardeal católico praticante de magia negra chamado Adaga de Prata, e após enfrentar inúmeros perigos surreais ali dentro (encontrando até a lagarta de ‘Alice no Pais das Maravilhas’), lemos a seguinte divagação do herói:



    O primeiro ordálio do Mago Supremo. Arte de Frank Brunner.

    Grande lição! Então, após morrer, o cenário muda e surge o Ancião, em sua forma cósmica, comunicando que o Strange venceu a primeira de uma série de provas que deveria se submeter como o mago supremo. Ele havia expulsado o medo da morte e recebeu, então, um ‘ankh’ na fronte do corpo astral.



    Ankh, vida, morte... Será que Neil Gaiman curtia o Doutor? Arte de Frank Brunner.


    A segunda provação do Doutor Estranho não saiu no Brasil, mas consegui na internet. Ele enfrenta a Eternidade (que na estória se autodenominou Adam Kadmon), a personificação do universo, que capturada por Pesadelo é manipulada e só pode ser detida com ajuda do Ancião que, novamente, retornou do Nirvana para ajudar o discípulo. Na primeira ele aprendeu a inevitabilidade da morte e na segunda a nunca abandonar a esperança pela vida. Ao final tem a surpresinha onde, ao partir, o Ancião se mescla com a figura da Eternidade dizendo ao discípulo: 'Que cara é essa? Sentiu-se traído? Surpreso? Eu não disse a você que havia me tornado uno com o universo?'


    Pelas Víboras de Valtorr: o Ancião vencendo a Eternidade com um O-soto-gari . Arte de Gene Colan.


    A fase de Englehart no Doutor Estranho (1973-1976) foi um tanto polêmica. Primeiro com a saga de Siseneg: o editor chefe, Stan Lee, viu a prova final da última edição e receoso de ofender leitores religiosos com a audácia em substituir Deus, pediu para Englehart escrever uma errata na seção de cartas da edição explicando que o deus citado ali não era o judaico-cristão, mas ouro qualquer. O autor não gostou nada disso e se recusou a mudar. Lee pressionou e não queria ceder também, por sua vez. Englehart então, de viagem para o Texas, escreveu uma carta falsa para a editora, sediada em Nova York, se passando por um pastor chamado Billingsley e que o seu filho adorava as estórias do Doutor Estranho, em especial a sequencia que estava envolvendo Siseneg. A carta foi publicada na edição e a errata não. Depois Sean Howe contou no seu livro ‘Marvel Comics: TheUntold Story’ que Englehart, Starlin, Al Milgrom e Alan Weiss (estes últimos também quadrinistas) na época tomavam LSD e saiam por Nova York e voltavam com essas estórias doidas na cabeça - uma edição da saga onde Estranho se perde dentro do Globo de Agamotto veio com o título 'Uma Realidade Separada' (3), referência a um livro de Carlos Castaneda.  A Marvel Comics chegou a receber sacos com ‘canabis havaiana’ contendo mensagens como 'Eu fumo um antes e coloco ELO (‘Electric Light Orchestra’), ELP (‘Emerson, Lake & Palmer’) ou Pink Floyd para ler o Doutor Estranho'. A parceria com Brunner acabou pois a onda dos dois era forte: Englehart fumava algumas e deixava cair o LSD e cogumelos no script mas conseguir refazê-los, enquanto para o desenhista a coisa não era tão fácil pois imaginava várias maneiras de fazer algo e não conseguia se decidir. Desanimado com o processo deixou o título e foi trabalhar em Howard, The Duck, outro sucesso subversivo da Marvel Comics anos 70: uma versão doida do Pato Donald.

     O médico e o monstro: Dr. Estranho em uma outra realidade. Arte de Frank Brunner.


    Claro que nada dessas histórias de bastidores chegaram aqui no Brasil que publicou as estórias anos depois; a maioria delas eu soube recentemente ao ler o ‘The Untold Story’. Apesar das influências do LSD, as estórias não contiam apologia ao uso de drogas colocando o Doutor Estranho como um homem de princípios, em conflitos pessoais e transcendendo-os enfrentando obstáculos como a morte definindo claramente o bem e o mal com toques de filosofias do oriente. A utilização dos alucinógenos servia apenas aos autores (Starlin também) buscarem ideias bacanas e encaixa-las em heróis honrados e lutadores. Para nós era apenas aventuras legais sem consequência negativa alguma em nosso desenvolvimento – eu acho.


    Englehart não escreveu mais personagens na temática do Dr. Estranho, apenas um livro chamado 'The Point Man', porém usava do tema de forma mais discreta como numa aventura dos Vingadores onde uma prostituta vietnamita (nos anos 70!) chamada Mantis (o inseto Louva-a-Deus) torna-se a ‘Madonna Celestial’, aquela que geraria ‘o ser mais importante do universo’. E de fato ela se une a um ‘Cotati’, uma raça de plantas telepáticas alienígenas, que tomou o corpo do seu namorado morto(4). Ele também fez o Fera, um cientista mutante com Q.I. elevado (e também membro dos X-Men) dizer que lia Castaneda para lidar com a sua transformação em uma criatura peluda azul.  Para terminar criou com Starlin ‘O Mestre do Kung Fu’ inspirado na série de TV com David Carradine onde Englehart viu a chance de escrever melhor sobre a filosofia oriental que ele tratava superficialmente no Doutor Estranho; misturou Bruce Lee com personagens das novelas pulp Fu Manchu de Sax Rohmer com grande sucesso também aqui no Brasil. 

    É... Alguns ainda  acham que Alan Moore e Grant Morrison apareceram com certas ideias ‘inovadoras’ nos quadrinhos.


    Bruce Le... Shang Chi largando o pai . Arte de Jim Starlin.


    Resumindo: a passagem de Englehart pelo Doutor Estranho tem aquilo que faz boas histórias em quadrinhos ao meu ver: emoções, expandem a imaginação e dão boas lições na criançada. Vai me dizer que John Constantine é melhor do que isso?
      
    Leia a parte I: Jim Starlin e os heróis que não riem.


    1 - Selo da DC Comics criado nos anos 90 focado em terror e magia inicialmente. Baseado nos fantásticos trabalhos de Alan Moore no Monstro do Pântano e Neil Gaiman em Sandman.

    2 - Gestos simbólicos realizados com as mãos. Muito comum na cultura hindu. Um dos mais famosos do Dr. Estranho é o ‘chifre do diabo’, muito usado por fãs de rock.

    3 - No Brasil o livro teve o nome de 'Uma Estranha Realidade'.

    4 - No Brasil saiu em Grandes Herois Marvel n°10.




    PS: ao pesquisar para este artigo encontrei uma estória do Thor onde aparece um diagrama do cinturão zodiacal ilustrando o fenômeno da precessão dos equinócios – o olho de Odin mostra isso ao Thor para auxiliar na explicação do Ragnarok.




    E na seção de cartas o autor explica do que se trata em termos astronômicos. 




     Chupa, Vertigo Comics!
  3. Herman Faulstich

    Inspirações em Quadrinhos – Parte I: Jim Starlin e os heróis que não riem.

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    Ainda criança, lá pelo ano de 1982, comecei a colecionar pra valer gibis de super-heróis; antes eu me recordo de ler alguns esporadicamente junto com os tradicionais Turma da Mônica e quadrinhos Disney. Comecei com Super Aventuras Marvel e , quando o dinheiro do ‘paitrocinio’ permitia, comprava edições saltadas de Heróis da TV, Hulk, Homem-Aranha e Capitão América.  Percebi que aventuras envolvendo o espaço sideral me atraiam mais e, entendendo isso somente mais velho, estórias de caráter metafísicoJornada nas Estrelas passava na TV na mesma época e contribuiu muito para a minha ‘formação’.  Nesse ambiente dois personagens me atrairam mais: Adam Warlock e Doutor Estranho, o que me levou aos autores: Jim Starlin e Steve Englehart. Tratarei do primeiro neste artigo.


    Jim Starlin


    Jim Starlin nasceu em Detroit e foi um veterano da Guerra do Vietnã que sobreviveu a uma queda de helicóptero na Sicília e a explosões no sudeste asiático. Não tem formação superior fazendo apenas um curso de psicologia em uma universidade gratuita na cidade de Detroit. Sendo um autodidata disse em 2008 que: 'Tudo o que eu aprendi sobre quadrinhos veio de Steve Ditko (1)e Jack Kirby. E Ditko fazia os melhores layouts'. Também contou que quando era um garoto de 15 anos, foi a Feira Mundial de Nova York e o único artista que deu atenção a ele foi Ditko que o convidou a conhecer o seu estúdio. Era pequeno, mas Starlin ficou maravilhado quando Ditko mostrou a quantidade de material que usava como referência para desenhar.


    Conheci a obra de Starlin numa aventura do herói chamado Adam Warlock em Heróis da TV n° 42. Tratava-se de um herói cósmico um tanto melancólico tendo sido criado por um grupo de cientistas como o primeiro homem artificial nascendo de um casulo. Foi concebido por um escritor chamado Roy Thomas que se inspirou na figura de Jesus Cristo, mais especificamente a de Jesus Christ Superstar, uma peça da Brodway que virou filme em 1973. Ele tinha uma joia na testa (ou no chakra 'Ajna') chamada 'Gema Espiritual' dona da capacidade de sugar o espírito de seres vivos para dentro dela, fazendo com dividissem suas memórias com Adam; isso incluiu um aspecto vampiresco ao personagem contribuindo muito para a sua melancolia. Starlin baseou-se fortemente na série inglesa 'O Prisioneiro' para compor a linha geral, pois apreciou o tom surreal beirando o absurdo unido a assuntos sérios. Como se não bastasse, tinha como melhor amigo, Pip o Troll, um anão tagarela, beberrão, que não largava do charuto e chegado em mulheres (ou qualquer alienígena parecido) inspirado visualmente em Jack Kirby, um dos maiores desenhistas de quadrinhos.



    ‘Bruxo Adão’ e ‘Tânatos’ em Heróis da TV n° 42.

    Starlin escrevia e desenhava as estórias onde ele enfrentava um alter ego futuro chamado Magus com a ajuda de um aliado inusitado, o vilão Thanos, um semideus insano oriundo da lua de Saturno, Titã. Starlin colocou Warlock como o campeão da vida, um herói louro, com pela alaranjada e trajes vermelho e amarelo, (caráter solar) e Thanos, em sua aparência escura, como campeão da morte – ele era apaixonado por uma personificação da 'maldita'. Posteriormente Thanos matou Warlock que teve o seu espírito levado para a jóia mística por ele mesmo vindo do passado que saiu dela por alguns segundos para transformar Thanos em pedra. Confuso? Sim, mas só lendo para entender melhor. Infelizmente a revista teve curta duração devido a problemas financeiros da editora relativos ao custo de impressão no Canadá. Warlock e outros títulos tiveram que ser cancelados e a saga foi encerrada de maneira abrupta (aqui no Brasil saiu em Grande Heróis Marvel n°1 em 1983).

    'O ser enquanto ser': não que eu tivesse entendido na época, mas era legal pacas.
      
    Ali passei a gostar do que Starlin fazia e soube que ele também trabalhara com outro herói cósmico chamado Capitão Marvel também em Heróis da TV. Marvel era um militar alienígena da raça Kree que se tornou defensor da Terra, usava braceletes de fótons que o permitia voar, disparar raios e viajar no espaço sideral.  Não li todas as aventuras que ele escreveu com o Capitão, pois não consegui todas as edições atrasadas, mas eu tinha aquela que até hoje considero uma das melhores do autor(2)chamada ‘Metamorfose (3), quando Marvel adquire a Consciência Cósmica (4)da entidade espacial chamada Eon. Para a criatura conceder o poder ao herói, ele enfrentou uma viajem interior que envolveu amor, vida, morte e um self maligno. Segundo livro ‘Marvel Comics: The Untold Story’ de Sean Howe, Starlin era ligado a psicodelia (que incluía doses de LSD) junto com amigos de trabalho como Steve Englehart e Alan Weiss conversavam sobre tudo: templários, Atlântida, os Illuminati, druidismo e Aleister Crowley; coisas do início dos anos 70. Numa dessas conversas os três debaixo de uma cachoeira discutiam sobre Deus e o resultado foi parar numa aventura do Capitão Marvel, onde Thanos, graças ao artefato chamado Cubo Cósmico, torna-se uma divindade, mas perde por não ter adoradores, com o Capitão quebrando o cubo. Englehart transportou isso para o Doutor Estranhocolocando-o para enfrentar um mago do século 31 que iria tomar o lugar de Deus (explicarei melhor no próximo artigo).

    Autoajuda cósmica: Capitão Marvel e a criatura Eon em Heróis da TV n°11.


    Starlin tinha uma abordagem de discorrer ideias metafísicas num layout de páginas, inspirados em Ditko, que só fui encontrar parecido anos depois via Alan Moore e Steve Bissette no Monstro do Pântano - as histórias dele datam de 1973 enquanto as de Moore de 1984 (5)


    'Psicodelices': Ditko em 1965, Starlin em 1973 e Moore/Bissette em 1985.


    Expert nesses temas com toques religiosos, Starlin foi criado em uma escola católica e não guarda muitas lembranças boas da época. Segundo ele as freiras falam coisas absurdas como o presidente Kennedy ser comunista e que a segregação racial era algo positivo, pois sem isso não haveria sistemas de classe e seriam todos comunistas e por aí vai. Ele comparou isso a um processo de lavagem cerebral que o afastou de religiões organizadas, dizendo até temer de certa maneira. E vemos isso em suas estórias, pois na saga de Warlock (um herói descrente de tudo), o seu alter ego maligno criou um culto religioso a sua volta chamado ‘Igreja Universal da Verdade’ e em Dreadstar um dos vilões é a organização chamada de 'Igreja da Instrumentalidade' cujo líder é o maligno Lorde Papal. Somado a isso, Starlin fez o tal curso de psicologia gratuito em Detroit após sair da marinha que forneceu as bases para a sua linha de trabalho. 

     O fim mais bem realizado nos quadrinhos: o amargurado campeão da vida ajoelha-se, lentamente, perante a morte sucumbindo à inevitabilidade. A cinética da queda do herói é fantástica e o desenho em estilo realista dá mais impacto ao momento, mesmo não sendo em página inteira. Uma aula de composição de cena.

    Logo no início da sua carreira na Marvel Comics, em 1972, ele ganhou uma oportunidade de escrever uma aventura do Homem de Ferro que estava nas mãos do seu colega de quarto, Mike Friedriche temendo não ter outra chance igual, colocou personagens com os quais sonhara uma vez durante o curso de psicologia em 1971: Kronos, Eros, Mentor, Drax, o Destruidor e o já citado Thanos, que viria a ser um dos maiores vilões da Marvel - tanto que apareceu no final do recente filme Os Vingadores. Segundo Howe, os personagens de Starlin não sorriem muito, servindo como gerenciamento da personalidade estressada do autor, que também não lida muito bem com autoridades conflitando sempre com seus editores Ele e os colegas Steve Englehart e Steve Geber (com Howard the Duck) fugiam a linha editorial da Marvel que visava sempre meio termos puxando para os limites dos padrões da empresa, misturando psicologia pop e crítica social;  e o próprio Starlin comentou: 'Eu estava tão doido quanto o resto das pessoas depois do caso Watergate e da Guerra do Vietnã. Cada uma dessas estórias era eu mesmo falando de coisas que se foram e tentando me colocar nelas; o Capitão Marvel era um militar que decidiu se tornar um deus e disso tratou a sua viagem', ou seja, ecos da Contracultura

    Jung e cogumelos: Capitão Marvel e a sua sombra em um cenário bem colorido.


    Passei a seguir Starlin em tudo o que ele fazia, nas diversas sagas de Thanos (sem o mesmo brilho da primeira com Warlock), a excelente A Morte do Capitão Marvel (que ele matou via um câncer e usou como ‘terapia’ pela morte do pai) com destaque para a saga de Dreadstar, um épico de caráter cósmico-existencial que, para mim, é o seu melhor trabalho. É uma transposição do próprio autor para os quadrinhos e conta a história de um guerreiro chamado Vanth Dreadstar oriundo de um mundo gelado portador de uma espada mística que se oculta dentro dele mesmo, sendo dividida em 4 partes:


         Metamorphosis Odyssey – publicado nos EUA a partir de 1980 na série de revistas Epic Illustrated, uma tentativa da Marvel Comics  de enveredar por temáticas mais sérias via ficção científica e fantasia baseada na revista francesa Metal Hurlant – aqui só foi editada em outubro de 2011. Conta a estória de um mago chamado Aknaton cuja raça, chamada de Osirosianos, foi a mãe da nossa. Ele vagou pela Via Láctea reunindo um grupo de 4 seres com o intuito de derrotar uma raça rival chamada de Zygoteanos, dentre os escolhidos estava Dreadstar. A aventura termina com a destruição da Via Láctea e Aknaton e Dreadstar fugindo do evento acordando milhares de anos depois em outra parte do universo onde, furioso pelo que aconteceu, Dreadstar mata Aknaton. Feita com arte pintada, o trabalho é de uma beleza impressionante cujo estilo se manteve nas próximas duas partes seguintes;

    Um quarteto fantástico: escolhidos para uma odisseia da metamorfose.

     The Price – publicada nos E.U.A. em 1981 e aqui em 1992. Conta a estória de Syzygy Darklock, um bispo da ordem mística de Vieltoor da Igreja da Instrumentalidade que preparando-se para uma tarefa, faz um pacto com um demônio e ganha poderes extraordinários mas que custam partes do seu corpo sendo transformado em um ciborgue com o rosto deformado além  do sacrifício de uma irmã da ordem por quem nutria carinho. Ao final ele encontra Dreadstar vivendo como um pacífico fazendeiro em um planeta isolado da galáxia.
    O bispo e um gato dos infernos.


         Dreadstar Graphic Novel -  nos EUA em 1982 e aqui em 1988. Narra a vida de Dreadstar depois de Metamorphosis Odyssey. Tornou-se um fazendeiro em um planeta habitado por uma raça humanoide felina. Casou-se com uma cientista humana vivendo em paz até a chegada de Darklock que avisa sobre futuras mudanças no esquema galáctico. Tais eventos atingiriam Dreadstar e, por isso, o mago passou a instrui-lo em questões relativas a galáxia em que viviam. Após algum tempo, uma invasão arrasa o planeta, matando a esposa de Dreadstar que sai em busca de vingança. Após obtê-la, junta-se a Darklock para instaurar a paz na galáxia que era assolada por um conflito entre dois grupos:  a Monarquia e a Instrumentalidade.


         
      Dreadstar – saiu nos EUA em 1982 e aqui em 1990. Foi uma série mensal contando com 70 edições publicadas por três editoras. No Brasil passou por duas editoras, Abril na série ‘Epic Marvel’ de 1985 a 1986 e Globo na ‘Dreadstar’, de 1990 a 1991. Eu li todas as estadunidenses (graças a internet, claro) e as que saíram aqui foram as melhores.

    Tudo que é sólido se desmancha no ar: Dreadstar sofrendo um ataque psíquico.



    Starlin sabe unir de forma muito interessante temáticas espaciais com magia além de colocar doses interessantes de existencialismo - na verdade o espaço sideral é uma excelente metáfora para descobertas e explorações, principalmente as internas onde a magia também atua.  Vale citar que ele escreveu a história onde o segundo Robin, Jason Todd, morreu espancado pelo Coringa usando um pé de cabra – houve uma votação e os leitores decidiram que Todd iria morrer sendo um sucesso de vendas. Ele ainda continua na ativa, mas após Dreadstar, não li nada com a mesma qualidade, principalmente por conta da arte já que os personagens são duros, muito estilizados e o excelente trabalho volumétrico de sombras foi abandonado. Mas isso não importa, leio todas as novidades que ele lança.  Foi indicado a várias premiações, ganhou dois Eagle Awards, três Haxtur Award. Em tempos de Facebook consegui me tornar ‘amigo’ de Starlin e mandar algumas mensagens para ele (que, por sua vez, nunca respondeu, mas tudo bem é prerrogativa do mestre cagar na cabeça do aprendiz ;) ). Quando comecei a ler quadrinhos, os autores eram pessoas inalcançáveis e dificilmente imaginaria contatar um deles. Estou no lucro.

    Anos 70: Starlin de tapa olho e Englehart como monge acompanhados de outros artistas da Marvel Comics (detalhe para a ilustração no objeto segurado pelo sujeito de óculos). 


    A seguir: SteveEnglehart e o Doutor Estranho (um mago muito melhor do que John Constantine).
     

    1- O artista que desenhou as primeiras estórias do Homem Aranha e criou personagens como o Questão e os da Charlton Comics que foram a base para Alan Moore escrever Watchmen. Possui uma visão política conservadora que colocou em seus quadrinhos e vive recluso em Manhattan ainda em atividade aos 87 anos - ele não é uma das minhas inspirações mas merece um artigo futuramente.

    2 - Assumo que é uma conclusão que envolve memória afetiva, pois o autor escreveu coisa melhor ao longo dos anos.


    3 - Heróis da TV n° 11 publicado nos EUA em 1973 e aqui em 1980.

    4 -  Consciência Cósmica era um tipo de união com o universo que amplificava a percepção do Capitão Marvel sobre a realidade, um tipo de iluminação budista.

    5 - Por aqui Moore apareceu na revista Novos Titãs n° 4 em 1986. Ele fez um trabalho junto com Starlin na série da Image Comics chamada Supremo. Saiu aqui no Brasil, mas não foi lá grande coisa, sendo apenas uma estória centrada no vilão da série. Moore escreveu e Starlin desenhou sem a mesma qualidade apresentada nos anos 70. 
  4. Herman Faulstich

    Rótulo da Cerveja ‘Cuvée do Cramulhão’

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    Meu primeiro trabalho de design envolvendo rótulo de cerveja. A proposta era trabalhar com uma cerveja tendo 18% de álcool, portanto forte, baseada no mito do demônio dentro da garrafa, que teve grande destaque nas novelas Paraíso e Renascer da Rede Globo - o que me agradou também foi o fato de poder desenhar um mascote, algo que gosto muito.

    A minha ideia envolvia seguir um estilo cordel pois o 'cramulhão' é um conceito já difundido no Brasil e combinaria com essa manifestação bem popular e enraizada culturalmente.


    Mas os primeiros rabiscos saíram sem personalidades e o estilo cru de cordel também não me remetia humor que considerei ser um elemento essencial no projeto, devido tanto ao nome quanto ao texto fornecido pelo cliente:

    "Roubada da reserva particular do próprio Coisa-Ruim, a CUVÉE DO CRAMULHÃO foi produzida pelos monges demoníacos da Abadia Invertida do Terceiro Círculo das Profundezas, com 6 maltes, 6 lúpulos e 6 leveduras e 18% de álcool - a mais forte que já surgiu no Brasil.


    Cheiro e gosto de pão que o Diabo amassou, fumaça, pimenta, madeira e frutas.


    Ardente, ardilosa e devastadora.


    BENZA-SE ANTES DE BEBER!"



    Resolvi fugir da referência direta ao cordel no desenho do diabinho seguindo uma linha pessoal.



    Cheguei a uma definição na segunda imagem acima; então escaneei passando a trabalhar no Corel Draw mantendo alguns elementos de xilogravura:



    Refinando - em especial as pernas e cascos - até a versão final que possui tanto um apelo humorístico quanto malévolo -  este refletindo o tom forte da cerveja :



    O cordel ficou presente nos elementos de fundo e nas fontes baseados também em xilogravura.



    Versões Finais



    Cuvée do Cramulhão - Cervejaria Enigma

    Matéria no O Globo:





  5. Herman Faulstich

    Querido Facebook…

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    Meus post mais curtido:


    Querido Facebook,

    Semana passada tive a verdadeira noção de que não passo de um mortal qualquer, mais uma pessoa entre bilhões nesta bola azul, um pontinho insignificante no universo infinito. Fui ao banheiro e a obra de arte saiu agigantada e seca prejudicando o anel. A coisa ficou dolorida pacas, mal podia sentar. Passei um dia, de pé, na vã esperança de que fosse sarar sozinho.

    No segundo dia tive vontade de ir ao banheiro; não fui. Medo! Mal podia sentar, imagine fazer aquilo? Passei o dia todo atento a qualquer sensação na área de escape, torcendo para que o esquilo não saísse da toca. Não consegui me concentrar em mais nada naquelas eternas 16 horas de intensa e paranóica vigília. Nutri-me como uma planta - à base de água e luz - para que não produzisse outra daquelas.


    No terceiro dia não deu para segurar. Fiz, e graças a todos os deuses, semideuses e seres mitológicos não doeu tanto, mas ainda continuava desconfortável. Ergui-me do trono esfuziante e contente por ter superado mais uma etapa difícil na minha vida quando a sorte deixou de sorrir para mim: eu espirrei. Eu nunca percebi que a rosca se mexe quando espirramos. Aliás, eu nunca percebi que ela se mexe em qualquer movimento que a gente faça!!! O centro do homem não é o coração, não é o umbigo, cérebro ou a alma é a rosca, o anel, o butão, o zóio, as pregas, o cu. Ao espirrar eu senti uma fisgada na portinha e pensei em desespero: "putaqueopariucaráleoquemerda". Eu me senti um nada. Uma ameba. Perdi toda e qualquer auto-estima naquele momento. Meio desbussolado, andei igual a um pato em direção ao banheiro, abaixei as calças e coloquei a mão: o rubro liquido da vida brotara. Limpei aquilo e, ao olhar o papel, me senti menstruado. Mulheres, eu sei o que é menstruar agora. Eu as entendo um pouquinho mais. Se tivesse Modess de bunda eu juro que colocava naquele momento.

    Nas horas de desespero recorro a única pessoa que não nega ajuda, aquela santa, idolatrada, pura, a bondade em pessoa: a mamãe. Já experimentada da vida, o ser luminoso indicou um remédio. Perguntei com nó na garganta temendo a resposta: "- Não é supositório, né mãezinha?" E a sorte me esboçou um sorriso através daquela face severa: "- Não meu filho, é um gel, onde já se viu supositório pra isso? Deixa de ser bundão!"

    Adquiri o tal remédio na vã esperança de aliviar o sofrimento até chegar o dia da consulta. O apetrecho, de forma incomodante fálica, consiste numa bisnaga com um bico plástico, comprido, vazado dos lados por onde sai o ungüento. Demorei alguns minutos achando uma posição para realizar a tarefa, consegui imitando uma tartaruga virada de cabeça para baixo com as pernas arreganhadas. Untei bem a fôrma e espalhei generosamente - fazendo uma lambança, claro, mas tudo bem. Então, como se as nuvens negras de um dia tempestuoso se abrissem, descendo anjinhos banhados por luzes divinas ao som da Primavera de Vivaldi, uma sensação diferente inundou-me: passei a sentir, entre os glúteos, um frescor! Um friozinho! Parecia Gelol!!! Não sei do que consiste a panacéia mas ela fez sumir a dor! Ainda bem que não existe igreja perto da minha casa, senão eu me converteria (mas eu postei uma daquelas fotinhas bregas de felicidade no Facebook)! Fui dormir feliz na sensação refrescante.

    No dia seguinte, alegre e pimpão, apliquei novamente aquela maravilha; na posição da tartaruga tombada fiz a ginástica e pronto. Saí de casa contente e, como a felicidade só é eterna enquanto dura - e sempre é pouco - o efeito colateral se fez presente: passar o dia com o rabo melado é terrível. Deus dá, Deus tira; deveria ter me convertido ontem à noite. Depois de algumas horas a pasta fica lá, cada vez mais presente; que sensação incômoda! Parece que as pessoas estão vendo o deslizar perfeito dos glúteos entre si no coeficiente de atrito zero. E a vontade imensa de coçar? Acho que rebolava de leve para ver se conseguia algum alívio; tenho certeza que as pessoas reparavam naqueles trejeitos esquisitos; eu sentia seus olhares, eu via que elas cochichavam entre si e me olhavam depois… deviam estar falando de mim! Tenho certeza!!

    Sentindo os efeitos psicológicos negativos do processo invadindo o meu ser, fui ao banco. Terminais fora do ar. Na terceira agência, de seis, apenas dois funcionando e uma fila enorme. Como tinha que pegar o dinheiro, fiquei ali, em pé não podendo fazer mais nada se não sentir aquela maldita viscosidade. Então um sujeito fura a fila fingindo conhecer uma moça que estava saindo de um terminal e começa a usar o caixa. Um senhor na minha frente chama a atenção do escroque e eu logo me exalto: "Você não é marido dela???" Aí eu, já nervoso, jogo meus cachorros no indivíduo. Começou um bate boca, o cara tentando justificar o injustificável eu nervoso, com a bunda emplastada me enervando ainda mais. Ficamos ali na jorro de testosterona e acabei por injuria-lo como "malandro"! Chamei varias vezes mas ele não tentou me agredir limitando-se a tentar me convencer da própria inocência, não sei se os meus mais de 1,90 m e cento e três quilos contribuiriam para isso, mas ele se foi. Os guardinhas do banco nada fizeram para acabar com o bate boca. Eles deveriam saber, profissionais da vigilância como são, devem intuir essas coisas, conseguem ler as pessoas de longe para saberem se configuram ameaça, que não deve se meter com um homem furioso, da minha compleição física, de rabo melado.

    Chegou o dia da consulta. Parecia um animal caminhando para o matadouro, uma criança contrariada indo ao seu primeiro dia de aula, uma mulher saindo do salão com um corte de cabelo ruim. A minha vida ia passando rapidamente: revivi meus melhores momentos, meus amigos, namoradas, bons momentos….MAMÃE! Religiões foram inventadas em momentos como esse, de total desespero onde achamos que algum milagre poderá alterar a inexorável realidade. "Devia ter rezado mais, devia ter ido mais a missa.. ah, São Judas Tadeu!!!" Já era tarde para o arrependimento. Entrei e me expus ao demônio de branco. Para a minha sorte, o Criador ouviu a sua ovelinha desgarrada e o problema se resolveu com alguns remédios prescritos.

    Uma dedada e quatro supositórios depois me considero uma pessoa melhor, mais humilde, que sabe da irrelevância das coisas materiais e do papel central do cu na existência humana.

    Herman
    (Cusciente do Cucentrismo da Vida)
  6. Herman Faulstich

    O Poder do Mito

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    Jasão e a serpente


    Se os heróis da mitologia estavam em poemas como a Ilíada e a Odisséia e na tradição oral, hoje eles caminham entre nós.


    Um herói, por definição, era um humano, aparentemente normal, capaz de feitos além do que se esperava de uma pessoa, transcendendo o comum. Tais heróis eram parte da mitologia que tinha como função colocar o homem em contato com o seu inconsciente - e assim com o transcendente - ou transmissão de valores morais.


    Recentemente, na cidade de Taubaté, pudemos ver essas idéias em ação: um militar aposentado vestiu-se de Batman para participar de uma campanha para a paz, devido ao alto índice de criminalidade envolvendo menores na região. Andy Trevisan (50 anos), auxilia a polícia da cidade no "combate as forças do mal" através de palestras pelas escolas e bairros. Segundo a Major Eliane Nikoluk, comandante do 5º Batalhão da Polícia Militar do Interior:


    É a figura do herói, despertando no jovem que vale a pena ser do bem, vale a pena ser bom, lembrar de valores positivos de respeito, respeito às leis”


    Batman de Taubaté


    Na Tailândia tivemos outro exemplo há três anos quando um bombeiro vestiu-se de Homem-Aranha para salvar um menino autista que subiu no parapeito do terceiro andar da sua escola e ameaçou se jogar. Sonchai Yoosabai voltou ao quartel e pegou uma das fantasias que utilizava para demonstração de combates a incêndios em escolas (a outra era do Ultraman). Encarnado como o herói, o bombeiro conseguiu fazer o menino caminhar em sua direção e assim salvá-lo.


    Homem-Aranha tailandês


    Por traz das máscaras e roupas coloridas se esconde um poder milenar que move a raça humana desde o seu princípio: os arquétipos.


    Os arquétipos, segundo Carl Jung, são "imagens universais que existiram desde os tempos mais remotos" no inconsciente humano que se manifestam nos sonhos e em narrativas. São representações de forças primitivas comuns a toda humanidade, reunindo qualidades sensíveis a percepção involuntária sendo aceitas instantaneamente. A figura do "herói" é uma delas, bem como a do "sábio ancião", a do "mestre" etc.


    Os exemplos de heróis acima citados vem das histórias em quadrinhos, que valendo-se das forças arquetípicas, construíram uma legião de fãs já há quase 100 anos, não apenas por esses conceitos "transcendentes" mas também pela massificação dos meios de comunicação que os tornam onipresentes em nossas vidas, como os cultos aos deuses do passado - e aos atuais também.


    Os quadrinhos, como um grande desfile de arquétipos, demonstram que são uma força de relevância em nossa cultura podendo ser utilizados para grandes fins; como no caso do Batman de Taubaté, pois não acaba-se com a criminalidade prendendo bandidos, mas fazendo com que eles não sejam criados.


    Arquétipo em ação


    As histórias em quadrinhos sempre foram subestimadas por terem o seu público inicial o infantil, pois as crianças respondem melhor as figuras coloridas e aos seus feitos irreais. Mas, com o tempo, elas foram perdendo terreno para outras formas de diversão na sociedade de consumo e os leitores tornaram-se adultos e adolescentes. Podemos perceber isso hoje mais facilmente com a produção cinematográfica que retira os quadrinhos do antigo nicho tradicionalmente conhecido. Mas os heróis serão sempre para crianças, as menores de idade e as que estão dentro dos adultos.
  7. Herman Faulstich

    As Sete Faces do Doutor Lao

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    Recentemente assisti As Sete Faces do Doutor Lao. Era um dos meus filmes prediletos na infância e, ao ver novamente, me surpreendi com a sua temática adulta. 
    Para os que tem menos de 35, trata-se da história de um circo que chega a uma cidade causando profundas mudanças nos seus habitantes mostrando a verdadeira face e expondo os desejos de vários deles. O circo é liderado por um velho chinês composto por um fauno, uma serpente falante, um filosofo grego cego que vê o futuro entre outros.



    Ele expõe alguns lados ocultos da natureza humana como a ganância e a sensualidade; este último foi tratado abertamente de um modo que não seria feito nos dias politicamente corretos de hoje. Eu nem lembrava disso pois não devo ter percebido isso na época por ser criança me prendendo ao visual.


    Os filmes infantis atuais jamais mostrariam uma coisa dessas. Bem… eu não vejo esses filmes hoje para saber se mostram ou não. Saudosismo é sintoma de tempo passando.


    Devo estar ficando velho. E chato.
  8. Herman Faulstich

    Superman: Literalmente um Mito Solar

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    Na minissérie All Star Superman (Grandes Astros Superman no Brasil) o famoso herói alienígena foi alçado ao status de mito. Como não poderia ser diferente, o autor  foi Grant Morrison, demonstrando, novamente, a sua erudição na área religiosa-mitológica e a profunda compreensão do que é a Jornada do Herói - para os que desconhecem, o mito do Herói Solar é constante na história humana como observou Joseph Campbell: trata-se de um padrão onde um indivíduo que sofre grandes adversidade, possuindo uma origem divina desconhecida a princípio, enfrenta situações extremas, as supera, morrendo para renascer ao final. Dos heróis gregos a Jesus Cristo passando pelos mitos do oriente e indígenas, o herói sempre esteve presente na cultura humana. 

    Caso exista alguém que ainda não saiba, Superman foi mandado pelos seus pais vindo de outro planeta quando este explodiu. Chegando aqui, graças ao sol amarelo, ele ganhou super-poderes e os utiliza em prol da humanidade.

    A estória em questão trata da última aventura do Superman, envenenado, ironicamente, por radiação solar graças ao seu nêmesis, Lex Luthor. Na última edição tratada aqui ele chega ao clímax, debilitado, após combater vários inimigos estando ainda o sol enfraquecendo devido a uma das últimas ameaças enfrentadas. Entrando na luta final com Luthor, que adquiriu os seus super-poderes, é chegada a hora do crepúsculo do herói. 

    A última parte começa com uma alucinação do Superman, adulto, no seu extinto planeta natal, Krypton onde o seu falecido pai, Jor-El, o leva para uma conversa. Aqui percebemos um prenúncio do fim, onde o cenário, um planeta tão morto quanto o pai, servem como indicação. Superman ouve tudo o que está acontecendo: a overdose de radiação amarela do sol está, de fato, acabando com ele. Jor-El diz:

     "O seu corpo está sofrendo uma mutação, uma conversão para rádio-consciência solar! Você deve se render ao processo."

    Utilizando a sua tradicional verborragia pseudo-científica, o escritor continua a explicação pela boca do pai solidificando as bases da sua ficção-mitológica:

    "Matéria, energia... essas coisas não podem ser criadas ou destruídas... a consciência também não, Kal-El de El. Após a morte corporal, conforme estudos Neoconservadores confirmam, a consciência individual persiste durante algum tempo e constrói para si palácios de pensamento ou complexos infernos para habitar..."



    A figura paterna

    Nada mais adequado do que a figura paterna para explicar a situação. O arquétipo do pai  tem como uma das funções ensinar; o filho aprende dele coisas como valores morais, a desenvolver habilidades para serem usadas em sociedade como a caça e "mostrar o lado duro da vida", em oposição a mãe, responsável pela parte carinhosa da criação. Ele encerra, ao final da alucinação, voando em direção ao sol de Krypton:

    "Mas o melhor de nós, o ouro em nós, sobreviverá em você! Tudo o que é impuro será queimado até virar cinzas. E tudo que for forte, grandioso e verdadeiro sobreviverá e renascerá."

    Percebemos claramente uma metáfora alquímica relativa à transformação. A estória de transformar chumbo em ouro enganava os alheios àquela pseudo-ciência também por causa de outra máxima: "Só se produz ouro com ouro". Na verdade, metais puros encontram-se misturados a minérios, devendo ser extraídos. Obviamente isso leva a um tipo de determinismo pois deve existir previamente algo nobre dentro de cada um. Não existe transformação milagrosa, uma conversão radical como a citação alquímica mais famosa faz entender. Aqui podemos tratar como metáfora de virtudes ocultas que desconhecemos, escondidas por restrições morais, religiosas ou sociais, referências ao despertar de divindades internas de cada um, segundo algumas religiões ou crenças esotéricas ou, segundo a psicanálise, a "sombra dourada".


    O Sol numa representação alquímica

    Superman então acorda, muito enfraquecido, e vai enfrentar a sua última batalha. Utilizando uma arma ele consegue resistir aos ataques do seu inimigo valendo-se de uma estratégia, a princípio, sem sucesso, até que algo acontece: Luthor, de posse dos super-poderes, aos poucos passa a sentir a verdadeira extensão do que é ser Superman, não são apenas as características físicas que ampliam-se (força, vôo e velocidade) mas a percepção. No auge ele tem uma epifania:

    "Desculpe... desculpe, estes novos sentidos... Na verdade eu consigo ver o maquinário e os fios conectando e separando todas as coisas desde que tudo começou... é assim que ele enxerga o dia todo, todo dia. Como se fôssemos apenas nós, aqui dentro, juntos. E somos tudo o que temos."

    Essa passagem explica algo bem interessante: a postura moral do Superman. Ele não é bom porque foi criado por um casal de fazendeiros protestantes num lúdico meio-oeste estadunidense, não foi devido a quaisquer valores morais terrestres, Sócrates não explica mas Sidarta Gautama: Superman é bom porque ele age como um Buda, ele enxerga a verdadeira estrutura da realidade e vê que tudo está conectado, tudo é uma coisa só. Segundo o pensamento budista, o último estágio da iluminação chama-se Nirvana, a "união com o todo" onde percebe-se que todas as coisas existentes estão vinculadas, não havendo separação entre elas. A dor de um é a dor de todos e ninguém deve ser prejudicado, nem mesmo os vilões. Muito da posição desse herói é criticada nos dias de hoje, vista como ultrapassada, pois alguém com tais poderes, deveria usar de forma mais ativa, agindo mais diretamente em questões políticas por exemplo, ou até egoísticamente em benefício próprio. Mas isso serviria, no máximo, para minar a capacidade humana de evoluir por si mesma. Ele serve mais como um símbolo de padrões elevados de moral do que um auxílio direto aos humanos. Assim comporta-se como um Buda, cujo objetivo (e de todo os ditos místicos ou magos) é contribuir para a evolução da espécie humana e isso implica em deixá-la cometer erros e aprender com eles.


    Superman e Lex Luthor

    O embate final acontece através de uma  luta física comum entre ambos com Superman vencendo não pela força, mas valendo-se de artimanha: "enrola" Luthor até passar o efeito do soro que deu poderes ao vilão. Ao invés de um final apoteótico, em larga escala de tons cinematográficos, o combate termina com um simples soco no queixo. Tanto uma referência a origem dos quadrinhos, onde a maioria das lutas acabava assim, quanto àquilo que faz um herói de fato super: a inteligência - ironicamente a principal arma de Luthor sendo vencido em seu próprio terreno.

    Superman, então, começa a morrer ou melhor, transformar. As suas células começam a se converter em energia pura e parte em direção ao sol para uma última missão: estabilizá-lo. Despede-se ali dos amigos, da namorada Lois Lane e voa em direção ao astro-rei. Isso remete aos belos finais cinematográficos onde o cowboy caminha em direção ao poente. Mas aqui o herói é solar, literalmente, permanecendo dentro da estrela estabilizando-a para todo o sempre.

    O autor consegue elevar o Superman a condição divina utilizando perfeitamente a morte como renascimento, uma mudanca, fechando um círculo, pois os seus poderes vieram do sol e o mesmo astro o eleva ao status superior.  Ele, paradoxalmente, torna-se imortal sacrificando-se para manter o sol aceso salvando a raça humana. De certo modo, torna-se a própria estrela iluminando aqueles que mais ama. 

    Não existe fim mais grandioso. E heróico.

    O herói transcendido no (e como o) sol


  9. Herman Faulstich

    Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher – Final

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    9 - Mistério - O mistério é um dos motivadores das religiões. O que existe depois da morte? O que é Deus? Ele existe? Porque estamos aqui? Religiões podem ser usadas como confortos em meio a estas dúvidas estressantes, principalmente às relativas a morte. A incerteza gera medo que desemboca em superstição, que pode ser usada pelo mercado. Por exemplo o das teorias da conspiração. Inúmeros livros e vídeos são lançados sobre o tema e, não raro, utilizado por vários cultos religiosos a fim de instalar o processo de insegurança, como vimos no  item 3 (Poder sobre os Inimigos). O foco padrão desse mercado são homens poderosos como presidentes dos EUA ou empresários como Bill Gates quase sempre ligados a fraternidades secretas e ordens esotéricas um vasto repositório para projeções conspiracionistas - Dan Brown que o diga. Não estou falando de outra coisa senão do cérebro emocional sendo trabalhado.


    O mistério também instiga a curiosidade. Não é dito que o proibido é mais gostoso? Parte do que define a Apple é a sua política de segredo. Ela concebe seus produtos da forma mais sigilosa possível visando esconder da concorrência mas gera um efeito interessante de buzz marketing. Os próximos lançamentos da empresa mexem com os neurônios especulativos dando razão de existência a inúmeros blogs e a outros tantos analistas de mercado; muito útil para uma empresa S.A.. Outro mistério bastante conhecido no mercado é a fórmula secreta da Coca-Cola escondida em um cofre em Atlanta que gerou inúmeras tentativas de obtenção pela concorrência e faz parte da mística da empresa.


    Mistério também se relaciona com expectativa. A indústria da cultura pop (filmes, quadrinhos, games e livros) vive de expectativa: artes iniciais de histórias em quadrinhos em produção no Facebook, fotos de filmagens secretas, teasers (os pré trailers*), descrições obtidas misteriosamente de trailers, informações obtidas com membros da equipe de filmagem e assim vai. É a manifestação da nossa imaginação, sendo mais projeções de desejos, que é o terreno da dopamina. Não raro a produto final dessas expectativas não corresponde ao imaginado por nós mas aí o já consumidor adquiriu o produto. Como disse o filósofo Nietzche: "Amamos desejar mais do que amamos o objeto de nosso desejo."


    10 - Ritualística - Rituais são quase sinônimos de religião. Contém um aspecto de realização de mudanças na natureza ou na própria vida da pessoa, com forte apelo emocional. Certos rituais, como os de iniciação em grupos esotéricos, são fortemente dramatizados para atingir as bases  emocionais dos que deles participam. Rituais envolvem superstição e fé pois são, na maioria das vezes, lidam com resultados incomuns. Quanto maior o clima de insegurança e imprevisibildiade mais as pessoas tendem a comportar-se supersticiosamente para orientar a vida, nesse contexto, rituais são tentativas do controle da realidade.


    Mas rituais também são protocolos de comportamento, uma forma de se integrar a um ambiente, seja ele uma casa de família seja uma audiência judicial. A ritualistica se extende aos nosso hábitos diários como os de higiene ou de compra. Hábitos tendem a nos tornar mais estáveis emocionalmente *. Um estudo feito pela BBDO Worldwide mostrou que em 26 países, a maioria das pessoas executa uma serie de rituais diariamente:


    • Preparação para a batalha - acontece pela manhã nas preparações para enfrentar o dia: escovar os dentes, tomar banho, fazer barba, ver os e-mails, entrar no Facebook etc.
    • Banquete - são as refeições com outras pessoas. É um ato social que nos faz membros de um grupo.
    • Ornamentação - ritos que transformam a nossa pessoa comum em seres mais bonitos, mais confiantes. As mulheres são as principais devotas deste tipo de comportamento, portanto um alvo interessante nessa abordagem.
    • Proteger-se do futuro - todos os atos preparatorios para o sono: desligar computadores, luzes, olhar os filhos, trancar a casa, deixar os itens para o dia seguinte prontos. Isso tudo ajuda a sentir-se mais seguro, mais preparado para o dia seguinte.

    Há casos em que os rituais de superstição e de hábitos acabam se fundindo, como aquele goleiro que sempre deixa um terço no pé da trave, ou benzer-se antes de pegar a estrada. Essa mistura atinge padrões culturais influenciando numa escala bem maior, como na Ásia onde o número do azar deles é o quatro cujo som, em mandarim, é si próximo de shi, o da morte. Nos hotéis chineses não existe o andar 44. O pesquisador californiano David Phillips descobriu que ataques cardíacos entre cidadãos de origem chinesa residentes nos E.U.A. aumentavam quase 13% no quarto dia do mês. Na Califórnia chega a 27%. Por outro lado, o oito é o número da sorte, cujo som é semelhante a "riqueza" e "prosperidade". Por isso os Jogos Olímpicos de Pequim foram marcados para começar no dia 08/08/08 às 8:08:08 da noite.


    Marcas utilizam rituais a seu favor como no caso da cerveja Guinness nas Ilhas Britânicas. Para servi-la corretamente, o garçom enche três quartos do copo. Depois espera-se até que a espuma do colarinho baixe. Então o garçom termina de completar o copo. Demora alguns minutos para que você comece a tomar a cerveja mas os clientes não se importam em esperar; este ritual é parte de se beber uma Guinness. Porém, nem sempre foi assim. No início dos anos 90 a empresa estava tendo problemas com isso, pois a cultura apressada não fazia ninguém querer esperar tanto. Numa jogada de gênio a empresa resolveu fazer da desvantagem uma vantagem lançando a campanha: "Good things come to those who wait" ("Coisas boas vêm para quem espera") e "It takes 119.53 seconds to pour the perfect pint" ("São necessários 119.53 segundos para servir o copo perfeito de cerveja") com comerciais ensinando a servir da maneira correta. A marca soube fazer do ritual parte da experiência em se consumir o produto, estabelecendo um elo emocional entre ele e o consumidor.


    Rituais valem mais pela experiência da realização em si do que pelos resultados que se deseja obter com eles, afinal são ações habituais, reincidentes com pouca ou nenhuma base lógica, agindo diretamente no cérebro emocional. Esse processo repetitivo, sendo uma das bases de um ritual, é encontrado em uma exepressiva forma de consumo: coleção.


    Colecionadores são os obsessivos de menor grau. O prazer em reunir itens envolve controle da realidade (pelo menos algum aspecto dela), conhecimento de informações restritas a poucos e até algum destaque social. Vira e mexe sempre aparece alguma matéria jornalística sobre algum colecionador. Não deixa de ser um ritual organizar os itens, consertar quando necessário e até mesmo, buscar pelos novos. Segundo o New York Times num artigo de 1981 "Living with Collections" 30% dos estadunidenses tendem a acumular coisas. Em 1995, o ano em que o eBay lançou o seu site, as vendas de artigos de colecionador chegaram a U$ 8,2 bilhões. Sabendo disso, muitas empresas lançam várias linhas de um produto, como as da boneca Barbie para o horror dos país - com elas as mulheres já começam a mandar desde cedo....


    Conclusão


    Lindstrom verificou se a relação entre marketing e religião transcendia aos dez pontos percebidos por ele. Submeteu 65 voluntários a testes coordenados pela Dra. Calvert. Mostrou a eles uma seqüência de imagens religiosas e de marcas fortes e fracas alternadamente: uma garrafa de Coca-Cola, o papa, um Ipod, uma lata de Red Bull, contas de um rosário, uma Ferrari esportiva, logotipo do eBay, Madre Teresa, um cartão American Express, uma criança rezando, logotipo da Microsoft no fim imagens de pessoas do mundo esportivo, um banco de igreja seguido por David Beckham, o hábito de uma freira e depois a Copa do Mundo. 


    Ao examinarem o resultado descobriu que o cérebro registrava praticamente os mesmos padrões de atividade tanto nas imagens de marcas quanto nas religiosas. As imagens das marcas em si geravam mais atividades do que as fotos e as religiosas; tinham mais poder do que as esportivas em ativar as regiões responsáveis pelas lembranças e tomada de decisões. Porém as de astros do esporte realmente ativava o córtex orbifrontal medial inferior, responsável pela sensação de recompensa, da mesma maneira que as imagens dos ícones religiosos. Nas imagens esportivas existe pouca atividade nas regiões de tomada de decisão e informação; é emoção pura e simples.


    Se eu fosse destacar uma palavra deste estudo seria emoção. Consumo e religião estão unidos pelo coração, mas ambos possuem objetivos centrais totalmente diferentes - a aquisição de bens materiais não tem muita semelhança em si com o relacionamento com seres superiores. Tão diferentes quanto o homem e a mulher. Mas estes também se unem, de fato, pelo coração.

    Doutrinas esotéricas dizem que as emoções são representadas pelo elemento água e ela ocupa aproximadamente 70% do planeta. Curiosamente os mesmos 70% na composição do ser humano. Agora vimos que as emoções ocupam uma grande porcentagem nos processo de tomada de decisão. Será que existe alguma relação? Se alguém encontrar algum estudo neurológico que atribua essa mesma porcentagem na relação razão-emoção me comunique. Irei começar a achar que a mulher realmente manda mais.....


    *A Marvel Comics lançou esta semana o tralier de uma cena pós créditos no filme do Capitão América. Trailer de cenas.....


    Capítulo I: Quem manda de verdade lá em casa


    - ANDERSON, Chris.Free. Editora Campus, 2009.
    - JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
    - HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
    - LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
    - NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
    - PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
    - UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009.
  10. Herman Faulstich

    Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher – Parte IV

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    A Verdade está aqui dentro

    5 - Narração de histórias - As grandes religiões são marcadas por histórias, principalmente de seus profetas. O maior exemplo para o ocidente é o bíblico, onde a história do povo judeu mistura-se a da própria religião daquele povo. Histórias são usadas como exemplos de conduta, justificativa de pontos de vista e metáforas. Muitas valorizam o esforço dos seus expoentes em prol da causa, momentos marcantes e até sobrenaturais - o que seria uma das demonstrações mais relevantes da autenticidade pois toca profundamente as dopaminas. Moisés abrindo Mar Vermelho ou descendo com as leis do seu povo bem como os milagres de Jesus Cristo ou a superação de Sidarta Galtama atingem diretamente o lado emocional do fiel por mais anti-naturais que pareçam. É tanto verdade que o questionamento desses eventos, não raro, causa reações calorosamente negativa dos que acreditam.


    Da mesma maneira acontece com marcas: as histórias das criações de muitas servem como o elemento que toca as emoções, pois são pródigas em feitos ousados e lances de sorte (que seriam o equivalente a interferência divina). Como na história da Microsoft onde jovens ousados e inteligentes, porém nitidamente mais fracos, dobram a gigante IBM emplacando um acordo que os faria bilionários causando uma revolução social ao, popularizarem o computador. Mais Davi e Golias do que isso não existe. Da mesma maneira a Apple onde, novamente, jovens contanto apenas com a inteligência e habilidades obtenham vitórias expressivas ludibriando monstros infinitamente mais fortes (no caso da interface gráfica e mouse da Xerox). Ambas as empresas compartilham da figura equivalente a um profeta  dotado da qualidade que mais os fez relevantes na história, um ideal. Sem dúvida havia interesses financeiro mas o ideais estimulam o córtex orbitofrontal (ver o item Visão Clara).

    Muito deste apelo nos toca pessoalmente pois mostra que qualquer um pode realizar seus objetivos, não importa se você é um garoto usando apenas com uma funda enfrentando um gigante armado ou um nerd sem carisma negociando com empresários muita mais experientes do que você. Marcas, assim como religiões, vendem experiências. Marcas são promessas de realização social. Religiões são promessas de vida melhor. Obama entendeu a força por trás deste conceito e aplicou em sua campanha vitoriosa representada pelo slogan: "Yes, we can!" Sim, você pode, tanto chegar ao Reino dos Céus quanto comprar uma casa . Os milhares de livros de auto ajuda, Os Segredos e prosperidade financeira bíblica que os digam.


    6 - Grandiosidade - Este item guarda estreita relação com o de Apelo Sensorial. Religiões e grandiosidade andam juntos, pois esta reflete um aspecto inerente a um dos pilares desses grupos: um ser (ou mais de um) superior ao humano. Arquiteturas de catedrais e do Vaticano por exemplo refletem essa idéia de superioridade através de tetos muito altos, abobadados, pinturas, tapeçarias e afrescos. Ou o esplendor do templo do Buda Dourado em Bangcoc onde reside um Buda de ouro maciço medindo 3,5 metros de altura.


    Da mesma forma, marcas apelam para a grandiosidade a fim de atingir o emocional do comprador, como os suntuosos hotéis de Las Vegas, as lojas da Louis Vuitton e da Apple. Outra forma de grandiosidade pode vir dos feitos da empresa, como o Google com o seu Google Maps que abrange o mundo todo ou da Virgin Galactic que promete viagens comerciais ao espaço.


    7 - Evangelismo - Mas um elemento relacionado a causa. Buscar e conquistar novos adeptos de uma religião para muitos é um exercício da fé. Dá sentido a escolha que a pessoa fez e a deixa mais feliz ao ver que outros compartilham do seu ideal (bem, como vimos, da mesma emoção também). Os Mórmons por exemplo, fazem da evangelização parte da religião, mandando seus jovens para o mundo todo. Obviamente existem aquela que fazem do evangelismo uma profissão, um meio de subsistência aproximando a religião do aspecto consumista tão criticado. Hoje pode-se dizer que no Brasil existe uma indústria da evangelização contando com canais de televisão, eventos musicais, roupas, livros e uma infinidade de produtos ligados a religiosidade utilizando-se de técnicas de marketing para conseguir seus intentos.


    Marcas também evangelizam, também buscam o seu público através das mais variadas táticas. O exemplo mais conhecido acontece no "P" de Promoção via a mídia impressa, televisão e internet. Mas a boa evangelização mercadológica não significa apenas captar o cliente, mas mantê-lo. Nem todo comprador é cliente. Comprador vai na sua loja uma vez na vida outra na morte. Cliente é fiel. As empresas mais preparadas valem-se de um forte trabalho nos pós-venda em prol da fidelidade, focando em um relacionamento com o mesmo seja oferecendo descontos nas próximas compras, seja lembrando do aniversário. Quanto mais apelar para o coração, melhor.


    Outra forma relevante no mercado de hoje é uma que ganhou mais visibilidade com o advento da internet: a abordagem do grátis. Pode-se resumi-la da seguinte maneira: experimente, se gostou pode continuar usando, mas se quiser mais, tem que pagar. Graças a iniciativas como o software livre e o modelo de colaboração, somadas a novidade da web como canal, a política do grátis expandiu-se na internet. O Google tornou-se uma empresa bilionária, disponibilizando serviços gratuitos, da mesma forma o Linux inseriu-se no mercado sendo o sistema operacional totalmente livre de custos financeiros para a utilização. 
    Segundo Anderson (2009) "Mais cedo ou mais tarde toda empresa precisará descobrir formas de utilizar o Grátis ou competir com o Grátis, de uma forma ou de outra."


    8 - Símbolos - Resumidamente pode-se dizer que símbolo é a representação de um conceito. Ao invés de gastarmos tempo lendo linhas e mais linhas de explicações, o símbolo resume tudo em poucos segundos. Na maior parte das vezes, essa informação é passada de forma indireta sendo captada pelo cérebro emocional. Por isso eles aparecem tanto em religiões: anjos, cruz, pombas, letras, desenhos, estátuas etc. Quando se trata de idéias tão abstratas como as religiosas, os símbolos são excelentes elementos a se utilizar. 


    Mas um símbolo também pode ser um gesto, um som e até um cheiro. Estamos acostumados com símbolo sendo imagem gráfica, mas qualquer um dos sentidos pode ser utilizado. O sinal da cruz é um símbolo bem como o "v" da vitória de Churchill ou a saudação nazista emprestada de Roma. Um canto gregoriano ou o cheiro de incenso. Um símbolo pode ser até uma pessoa, por exemplo, Bob Marley como representação do reggae ou Steve Jobs como da Apple, sem falar nos garotos propaganda (vide o "garoto" da Bombril).

    As marcas utilizam fartamente de símbolos, principalmente pela propaganda. O logotipo é o mais conhecido pois aproxima-se mais da referência mais conhecida (visual e gráfico) seguido pelos mascotes, uma visão mais lúdica no branding. Mas empresas valem-se do estímulo dos outros sentidos para reforçar as suas idéias sobre si mesmas e seus produtos, principalmente com a forte competição do mercado onde a necessidade de diferenciação e resultado aumenta. O som padrão do celular Nokia já promove associação imediata com a marca da mesma forma que o cheiro inconfundível do sabonete Phebo.


    Nas religiões símbolo e arte andam juntos. A Igreja Cristã Ortodoxa não se diferencia da arte sacra dos Ícones bem como a Católica das estátuas dos santos. Na islâmica as caligrafias arabescas representam de forma inequívoca a religião uma vez que a pintura de seus expoentes foi minada pela proibição da representação de Maomé. Caso curioso é do Protestantismo que eliminou toda a arte, representações e ritualistica do Catolicismo; mas alguns representantes passaram a estimular os sentidos através de música e pregações carregadas de emoções, seja no discurso do pastor, seja nas catarses dos fiéis.


    Do estudo de símbolos para as mensagem subliminares é um passo, pois um símbolo visa não só transmitir uma série de conceitos mas o despertar reações por parte de quem o contempla. Da mesma forma, as mensagens subliminares no mercado visam determinadas reações, altamente direcionadas do consumidor, pelo menos pela esfera popular.


    Muito do que é falado das subliminares vem carregado de crendices conspiratórias. Na verdade elas funcionam muito mais de forma indireta do que a direta, como gostam de alardear os paranóicos de plantão. A velha história de frases que duram milisegundos em filmes ou músicas que, tocadas ao contrário, revelam mensagens ocultas são entendimentos sensacionalistas do mecanismo. As massas já demoram a entender textos em cartazes estampados na paredes imagine os que elas nem vêem? Da mesma forma que as letras das músicas passam desapercebidas, imagina alguma que você ouve apenas tocando ao contrário?


    As subliminares funcionam despertando sensações ou emoções na pessoa e não ordenando um comportamento específico ou altamente direcionado do tipo "Compre Coca-Cola". Quando uma marca de cerveja coloca gente jovem, alegre, bonita em clima de festa e descontração ela os está usando como subliminares para que você associe o produto a alegria e ao bem estar. Soma-se a isso um processo de ancoragem (ver na parte II)  colocam um gestual específico, o sinal do número um na Brahma por exemplo, marcando mais ainda no seu cérebro emocional. Do mesmo modo, nossos comportamentos não verbais são os nossos sinais subliminares. O exemplo mais conhecido ocorre na sedução onde mudamos a postura, o tom de voz, o olhar, tudo para passar, indiretamente algum sinal: "te quero", "estou disponível" etc. Subliminares são usadas na política quando vemos os gestos estudados dos políticos, as suas aparências e modo de falar, bem como na qualidade da luz e imagem de suas propagandas políticas tudo visando uma associação com idéias emotivas de segurança e capacidade.


    Outro fator que tira bastante o poder mágico das subliminares é o alto custo que existe para que ela (a indireta) faça efeito: a exposição deve ser constante a atingir o maior número possível de pessoas e, para isso, o investimento em horários televisivos, mídia impressa e digital é grande.


    Lindstrom (2009) observa que o principal símbolo das empresas, o logotipo, não é um diferencial significativo como se pensava, muitas vezes funcionando até contra, não passando de mais um elemento da estratégia de branding. Ele conta de um experimento realizado pela dra. Gamma Calvert, catedrática de Neuroimagem Aplicada  da Universidade de Warwick, Inglaterra e fundadora da Neurosense em Oxford e pelo professor Richard Silberstein executivo-chefe da Neuro-Insight na Australia. A um grupo de fumantes, foram mostradas imagens associadas a comerciais de cigarros (caubóis em belas paisagens, carros de formula um e da Nascar, parafernálias de corridas) mas em duas etapas: sem e com logotipo, nome da marca e cigarro.


    As imagens da ressonância mostraram, atividade pronunciada nos nucleus accumbens - área ligada a recompensa e desejo - mas, para a surpresa da equipe, em maior grau nas imagens com ausência do logotipo. Além disso, demonstrou uma relação emocional direta entre as qualidades que os voluntários associavam a Formula Um, Nasdac - masculinidade, sexo, poder, velocidade, inovação - a ás marcas de cigarro que patrocinavam. No caso da ausência do logotipo como não eram imagens nitidamente publicitárias, o participante baixou a tradicional resistência crítica do córtex pré-frontal, sentindo mais livremente o processo - ou seja, a patroa mandando de novo.




    Próximo capítulo: Conclusão
    Capítulo III: É Diferente mas Igual
    Capítulo II: A Parte Racional


    - ANDERSON, Chris.Free. Editora Campus, 2009.
    - JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
    - HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
    - LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
    - NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
    - PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
    - UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009.
  11. Herman Faulstich

    Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher – Parte III

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    É Diferente mas Igual


    Como vimos, os estudos de neuromarketing mostraram que o processo decisório é fortemente baseado na emoção - ou a parte feminina do cérebro - que, por sua vez, é o elo principal que une religião e o consumo. Mas Lindstrom (2009) mapeou outros dez pontos onde ambos se conectam de forma intrinseca:

    1 - Sensação de Pertencimento - participar de uma determinada igreja evoca as mesmas sensações de usar produtos de uma marca, quase como sentir-se membro de um clube restrito - donos de Harley Davidson e macmaníacos que os digam. Religiões possuem um fator de agregação social muito forte e isso também é encontrado no consumo de marcas, onde este é impulsionado por uma necessidade de aceitação social, pois a etiqueta fala pela pessoa bem como fazer parte de um grupo religioso pode dizer muito sobre o caráter e valores dela. 

    O consumo de marcas esportivas, por exemplo, segue o mesmo padrão. Entre homens: em quantas rodas de estranhos já não iniciamos uma conversa ao saber que a pessoa torcia para o mesmo time que você? Isso ajuda na aproximação. E a devoção igualmente religiosa tendendo ao fanatismo de determinados torcedores que os une em um grupo? O termo "nação corintiana" aciona os mesmos mecanismos emocionais do que  "povo de Deus" em termos de agregação social. Vemos a mesma coisa no ramo musical. Fãs de rock existem aos montes andando com as suas camisas pretas, cabelos grandes reunindo-se em suas diversas tribos. O homem possui uma necessidade instintiva de se reunir, fazer parte de grupos assim como várias espécies de mamíferos, principalmente os superiores, e lembrando São Tomás de Aquino em 1273: "O homem é por natureza, animal social e político, vivendo em multidão."
    Religiões tendem a utilizar outro significativo conceito agregador: a família. Existe laço mais forte do que o familiar? Talvez o maior exemplo disso seja o do povo Judeu. Há séculos uma cultura que resistiu sem unidade territorial, suportando vários períodos de escravidão e até a perda da escrita (quando escravos na Babilônia). Mas eles se mantiveram devido ao sentimento familiar em manter um laço milenar com um ser superior. No outro lado da moeda, a abordagem familiar é utilizada também por marcas como recentemente em um vídeo mostrando uma confusão relativa ao cancelamento de um show da banda brasileira Restart. Os fãs, pré adolescentes, chorando compulsivamente dizendo que eles eram da "família Restart" e que não poderia estar acontecendo aquilo com eles.

    Por fim, não existem semelhanças entre os fiéis reunidos assistindo um pastor falando das recompensas espirituais ao seguirem aquelas palavras e o grupo de fãs vendo Steve Jobs no palco trazendo as boas novas em forma de objetos eletrônicos? Os mesmos mecanismos cerebrais estão lá sendo ativados, mas para finalidades diferentes.

    2 - Clareza de Visão - grande parte das religiões possui uma visão definida quanto aos seus objetivos e promessas: redenção pessoal, salvação da humanidade, vida após a morte, encontrar o sentido da existência, extinção do sofrimento etc. Empresas também precisam ter a sua missão bem definida, tanto para o cliente quanto para os funcionários. A Microsoft com o seu "Um PC em cada casa" é um excelente exemplo de clareza. 

    Existe outra abordagem, onde o discurso contém elementos aspiracionais que excitam as moléculas dos sentimentos como a Apple nos anos 80: "O homem é criador de mudanças neste mundo. Como tal deve estar acima dos sistemas e estruturas e não subordinado a eles."  As missões religiosas seguem mais essa linha, principalmente quando tocam nas questões relativas à morte, onde o instinto de sobrevivência é diretamente afetado.

    E temos o contrário em termos de reação, certos slogans que não deveriam ter sido utilizados como o famoso caso do Mercedez Classe A: "Até você pode ter um Mercedez" - onde lia-se nas entrelinhas "Até você (seu pobre) pode ter um Mercedez". Aqui as emoções também foram acionadas, mas apertaram o botão errado: o da ínsula, parte do cérebro responsável por sentimentos de rejeição. 

    3 - Poder sobre os inimigos - a existência de um inimigo cria a oportunidade de demonstrar a fé bem como gerar mais união entre os seguidores, esta última valendo-se, muitas vezes, de uma manipulação emocional poderosa: a tática do medo

    Quanto maior o estresse e a insegurança maior é a probabilidade de nos comportarmos irracionalmente desembocando no medo sendo um passo para a superstição. O medo mexe com nossos instintos passando por cima do córtex pré-frontal. Ao expor um ambiente de insegurança generalizado, afirmando que determinados valores caros a uma determinada religião estão acabando ou sendo destruídos por um inimigo qualquer, o cenário está armado. Em relação ao marketing, o mercado de seguros vive do medo. O de segurança privada, idem bem como o de saúde principalmente quando o assunto é saúde dos filhos, onde o instinto de proteção é o alvo principal.

    Um inimigo dá sentido a muitas causas religiosas. O termo não foi em vão: causa. Aqui o lado aspiracional da coisa é cutucado sem piedade. Não é a toa que certos cultos cristãos falam tanto em Jesus Cristo quanto no diabo, quando não ampliam o espectro das forças do mal para as religiões afro- brasileiras e até para outros grupos cristãos, garantindo assim, um grande leque de oportunidades para demonstração da fé e assim salvá-lo (mesmo que você não queira ser salvo). Tom Freedman -  estrategista e conselheiro sênior do governo Bill Clinton e dono de uma empresa que estuda o processo de tomada de decisão -  descobriu que a análise das amígdalas poderia ser benéfica para o desenvolvimento de anúncios políticos. Sendo as amígdalas responsáveis pelas sensações de medo, terror e ansiedade. A manipulação do medo dos eleitores pode ser benéfica em uma campanha como aconteceu nas eleições estadunidenses de 2004, vencidas pelo partido republicano ao focar bastante na ameaça terrorista.

    Essa mentalidade "nós contra eles" impera também no mundo do consumo onde, por exemplo, os applemanícos sentiam-se melhores do que os infelizes usuários da Microsoft fora a lendária briga da Coca-Cola versus Pepsi nos E.U.A.. 

    4 - Apelo Sensorial - ao adentrarmos igrejas e tempos somos tomados pelo clima do local, seja pela visão das artes sacras, vitrais ou arquitetura seja pelo cheiro de velas ou perfume utilizado. O silêncio chega a ser um elemento imprescindível para ambientes como esses bem como o chamado de uma membro da mesquita em sua louvação a Alá ou os sinos de uma igreja com seus sons característicos. Esses elementos nos conectam emocionalmente com a religião reforçando o apelo inconsciente a dopamina.

    Os mesmos elementos que visam atingir os sentidos burlando a racionalidade são utilizados numa Apple Store na sua arquitetura estilosa, no design de seus produtos e embalagens além da interface gráfica dos programas. Basicamente o sentido mais usado é a visão porém, hoje, já existe uma certa preocupação com os outros quatro fazendo com que o consumo de um produto não seja mera utilização mas uma experiência - e isso inclui a tomada de decisão. 

    Underhill (2009) chama a atenção para o quanto as empresas perdem em não permitir que o consumidor avalie o produto antes (e isso acontece através dos sentidos). Segundo ele, 90% dos novos produtos alimentícios fracassam porque não são experimentados. Marcas de cueca estão perdendo oportunidade em lacrar o produto nas caixas já que as mulheres sempre tocam a roupa íntima antes, posi querem sentir como será o contato com a pele. Do mesmo jeito com roupas de cama. Por outro lado, supermercados já colocam padarias dentro fazendo com o cheiro do pão fresco estimule a venda, dele mesmo e de outros produtos conjugados. Na Inglaterra algumas lojas de produtos infantis canalizam talco de bebê  na ventilação para lembrar aos compradores o cheiro marcante de recém nascidos. Segundo Underhill, os aromas são a nova fronteira do marketing, pois o olfato é um dos sentidos mais negligenciados. Menos para as religiões indianas. 




    - JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
    - HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
    - LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
    - NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
    - PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
    - UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009.
  12. Herman Faulstich

    Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher – Parte II

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    - A Parte Racional - é o homem da casa, o senhor da razão. É a área mais nova do órgão chamado de córtex pré-frontal, presente nos primatas superiores, porém mais desenvolvida no ser humano. Na tomada de decisões é responsável pela análise lógica e fria de uma situação, tendo a capacidade de ignorar as emoções: é o cocheiro que controla os cavalos (ou pelo menos tenta).


    Esta estrutura foi um avanço tremendo na evolução (desculpem-me Criacionistas), pois permitiu o ser humano contemplar a si próprio e as emoções dando a ele a capacidade de ignorá-las se necessário. Por exemplo, se formos ceder sempre ao cérebro emocional na hora de uma compra, corremos o sério risco de passarmos por problemas financeiros.


    Os religiosos sabiam bem disso ao conceber o conceito de tentação tão bem exemplificado na passagem onde Jesus Cristo é tentado pelo diabo, uma excelente metáfora para o embate dos córtex orbito e pré-frontal. A parte racional resistiu as provocações da irracional mantendo-se fiel as suas crenças negando seus instintos de sobrevivência na primeira tentação, rebatendo uma afirmação intelectual com outra mostrando capacidade raciocínio e discernimento intelectual na segunda e na terceira resistindo aos sentimentos de posses materiais através de sentimentos relativos a sua fé de modo consciente. Um significativo exemplo de controle racional em uma situação emocional extrema.

    Com o córtex pré-frontal somos capazes de descobrir porque sentimos determinada emoção e assim controlarmos melhor nossas reações e, consequentemente, as decisões.
    A razão pela qual ele detém esse poder se deve a sua estrutura estar conectada a praticamente todas as áreas cerebrais sendo um caminho para a maioria das informações que circulam pelo órgão. Além disso ele é muito versátil como disse Lehrer: "sabendo trabalhar com vários tipos de dados sendo assim a única capaz de pegar um princípio abstrato e aplicá-lo em um contexto estranho para chegar a uma solução original" (vulgo criatividade). Basicamente é o que nos separa dos animais; porém, por ser uma formação recente, carece de complexidade sendo susceptivel a algumas falhas.


    Quando o córtex pré-frontal entra em atividade ele tende a tomar o controle de decisões e ações que são realizadas inconscientemente sabotando o processo. Quando se pensa muito a respeito de uma atividade que está fazendo a ansiedade pode crescer tanto que o cérebro se questiona sobre todos os movimentos ocorrendo um colapso prejudicando a ação realizada, quando não raro, impedi-la. E gastar muito tempo em considerações pode fazer com que nos concentremos em variáveis sem importância minando qualquer decisão ou nos fazendo comprar algo pela razão errada. A necessidade de controle gera, paradoxalmente, um descontrole *.


    Quando vamos a um shopping somos atacados por um exército de informações que podem desviar a nossa atenção. Segundo o psicólogo Geroge Miller, o cérebro consciente consegue lidar com sete pedaços de dados ao mesmo tempo, variando de + dois, além disso, a memória de trabalho e a nacionalidade ocupam o mesmo espaço, o córtex pré-frontal. Quando se está realizando um esforço de cálculo ou recordação de informações, os impulsos tendem a mandar nas decisões.


    Mais ou menos como o homem e a mulher. Elas não são conhecidas por conseguirem fazer mais de uma atividade ao mesmo tempo enquanto nós, ao volante, temos dificuldade em tentar achar o caminho com elas falando ao mesmo tempo? O homem não consegue ser multitarefa, assim como o cérebro racional.


    Outra desvantagem do aparelho racional é o consumo de energia; uma pequena queda no nível de açúcar no sangue facilita a perda de autocontrole. Essa é a base de conversões religiosas forçadas e lavagens cerebrais. A parte racional é inibida através de jejuns súbitos com leitura específica imposta além da pessoa ser submetida a alto nível de estress emocional. Voltando ao exemplo de Jesus Cristo, ele estava sob ação desse princípio: faminto por 40 dias e sozinho no deserto á mercê de um forte estress físico e emocional.Quanto maior a insegurança maior é a inibição da parte racional e a probabilidade de nos comportarmos irracionalmente e aceitarmos quaisquer tipos de valores teóricos aumenta. Como percebe-se pela variedade de correntes filosóficas e religiosas, a razão justifica qualquer ponto de vista**.


    Outra forma de enganar o córtex pré-frontal é através de um processo chamado de ancoragem. Ao associar um ato secundário a uma decisão, esta pode ser afetada em função do primeiro como em um experimento descrito por Lehrer: em um leilão realizado com alunos de economia foi pedido que, antes de fazerem o lance, anotassem os dois últimos dígitos do registro na previdência social. Descobriu-se que, os alunos com dígitos mais baixos, faziam as ofertas mais baixas e os com números maiores, as mais elevadas. Os alunos com números mais altos estavam dispostos a pagar mais. O cérebro racional não é bom em ignorar fatos mesmo sabendo que são inúteis. Na prática, você pode tomar decisões equivocadas por levar em conta informações desnecessárias, como faz um ilusionista ao fazer um gesto específico tirando a sua atenção do verdadeiro movimento.


    Como vimos então, a base do comportamento decisório é a emoção apesar da possibilidade da consciência tomar o controle do processo, mesmo sendo facilmente enganada. Nessa briga de marido e mulher ela nunca tem a razão mas ganha na maioria das vezes.



    Como eu vi recentemente no filme O Cisne Negro: "Perfeição não é somente controlar mas saber abandonar-se."

    ** Outras técnicas emocionais são o "Love Bombing" onde um excesso de carinho e atenção é direcionado ao novato infantilizando-o ou incutindo sentimentos de culpa caso não aja de determinada maneira.

    - JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
    - HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
    - LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
    - NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
    - PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
    - UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009.
  13. Herman Faulstich

    Marketing e Religião: Quem Manda é a Mulher

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    Associação controversa para muitos, marketing e religião andam lado a lado. Apesar de aparentemente não guardarem relação - afinal, o que ciência de mercado tem haver com religião* - uma visão mais aproximada revela muitas semelhanças. Não me refiro as idéias ja bastante conhecidas de corporativização religiosa e sim as semelhanças ontológicas entre ambos.

    Mas para explicar melhor é necessário enveredar pelo verdadeiro órgão responsável por levar alguém tanto ao shopping quanto a uma igreja: o coração.


    Quem manda de verdade lá em casa


    O que é a intuição feminina? É o resultado de milhares de anos sem pensar.
    Anedota popular




    Tanto no prazer em buscar o contato com uma inteligência superior quanto em decidir por qual carro comprar os mesmos mecanismos emocionais são ativados. Existe algo em comum acontecendo dentro da nossa cabeça ligado a sentimentos diversos: decisões emotivas.
    Lehrer (2010), através de estudos neurológicos explica como o processo funciona em um cérebro dividido entre a razão e a emoção. A teoria vigente até então colocava a razão sob os holofotes deixando as emoções como coadjuvantes. Mas as análises demonstraram que o ator principal é outro. Vamos ao elenco começando pelas damas:

    - A parte emocional - poderíamos chamar de parte feminina do cérebro por razões óbvias. Basicamente é formada pelo sistema límbico que, por sua vez, é composto pelos setores mais primitivos do órgão. A parte mais nova chamada de neocórtex pertencente aos mamiferos superiores sendo ela que nos diferencia dos animais por ser a sede do raciocínio lógico, inteligência e da moralidade.

    Durante todo o sec. XX o processo de pensamento foi associado mais fortemente a razão uma vez que era exclusivamente humano.Tendeu-se a dar enorme poder a característica racional criando a idéia de que agia á parte das emoções e, até mesmo, as dominasses sendo capaz de tomar decisões isoladamente. Mas recentes estudos da neurologia derrubaram esta teoria.
    Foi descoberto que, uma pequena parte da área frontal do cérebro, o córtex orbitofrontal, é responsável por integrar as emoções ao processo de tomada de decisão estando sempre em atividade. Conecta os sentimentos primitivos ao fluxo do pensamento consciente.
    Os homens ficam de saco cheio das mulheres opinarem á toda hora sem serem perguntadas não é? Pois então, no cérebro é a mesma coisa.

    Mas porque as emoções foram integradas ao processo de pensamento? Acontece que o neocórtex, apesar dos prodígios dos quais é capaz como acumular conhecimento, planejar e até contemplar as proprias emoções, veio com alguns bugs. Por ser uma parte recente do cérebro ainda contém algumas falhas de projeto fazendo com que, por exemplo, uma calculadora barata seja mais rápida do que ele. Já o cérebro emocional, por ser composto de partes muito antigas, desenvolvidas e testadas há centenas de milhares de anos, possui um refinamento e estabilidade invejáveis. Ele é capaz de processar uma quantidade e variedade de informações muito maiores do que o racional e isso acontece através dos sentimentos e sensações, pois são eles que permitem assimilar os dados que não poderíamos compreender diretamente.




    O coração na cabeça

    Por exemplo, em um jogo de beisebol: o cérebro do rebatedor não tenta calcular friamente a velocidade e a trajetória da bola no momento em que ela sai da mão do arremessador. Não haveria tempo hábil para isso. Acontece que, antes do lançamento, o sistema primitivo cerebral já começa a tentar prever o resultado analisando a postura do arremessador, o tempo do movimento, a tensão do corpo junto a outros fatores relacionados a experiências anteriores. Isso demanda um processamente muito grande de informações em um curto espaço de tempo, inviável para o neocórtex. Por acaso ao dirigir ficamos raciocinando em todos os movimentos que iremos fazer?
    O cérebro é uma máquina de reconhecimento de padrões; a todo momento os busca para a tomada de decisões e as emoções são o combustível do processo. Elas não agem aleatoriamente, os neurônios estão sempre se modificando assim que cometem um erro ou percebem uma novidade. Ao encontrar algo que dá prazer (como um produto desejado), uma årea do cérebro chamada núcleo accumbes (NCC) é ativada, disparando o neurotransmissor dopamina responsável por gerar uma sensação de felicidade no consumidor. Como parte do processo de reconhecimento de padrões, a dopamina excita o cérebro em momentos de recompensa e o pior, em momentos de recompensa surpreendentes como em jogos de azar. E ela também está conectada as áreas de desprazer representadas pela amígdala ao se deparar com algo respulsivo. A tomada de decisão começa com flutuações de dopamina.
    E de que serve todo esse papo biológico? Bem, estudos dessas áreas quando expostas a produtos ou pessoas (no caso de políticos, por exemplo) podem ajudar muito em análises de aceitação ou rejeição dos mesmos. Os estudos conseguem antever as emoções pelas indicações sensoriais resultantes dos padrões construidos pelos neurônios nesse vai e vem dopamínico facilitando uma abordagem mais eficiente de "share of heart".




    Dopamina: a molécula das emoções


    Segundo George Loewenstein, economista comportamental de universidade de Carnegie Mellon, a maior parte do cérebro é dominada por processos automáticos e não por pensamentos conscientes, boa parte do que acontece no cérebro é emocional e não cognitivo. Somando a isso a estatística de Nunes (2009) onde 80% das decisões de compra no varejo são tomadas no ato, favorecendo as por impulso, percebe-se que, mais do que nunca, a patroa é a decisora mais influente em uma compra seja ela de produtos, seja de ideais - principalmente os religiosos.

    Aqui no sentido das religião de massa.


    - JUNIOR, Marino Raul. A Religião do Cérebro. Editora Gente, 2005.
    - HASSAN, Steven. Combatting Cult Mind Control. Park Street Press, 1990.
    - LEHRER, Jonah. O Momento Decisivo. Editora Best Business, 2010.
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo. Editora Nova Fronteira, 2009.
    - NUNES, José Mauro Gonçalves. Apostila de MBA em Marketing, Comportamento do Consumidor. FGV, 2009.
    - PINHEIRO, Roberto Meireles. Comportamento do Consumidor . FGV Editora, 2006.
    - UNDERHILL, Paco. Vamos às Compras!. Editora Campus, 2009..
  14. Herman Faulstich

    Mascotes na Estratégia de Marca

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    Parte da ciência do branding, os mascotes ajudam no processo de diferenciação da marca e contribuem para aumentar a ligação emocional do consumidor com a mesma*. Considero esta ultima a grande vantagem de se utilizar mascotes. O desenho de personagens tem o poder de síntese e expressão de valores mais elevado do que um logotipo, uma vez que logos possuem um abstração formal acentuada que limita a sua capacidade de transmissão de idéias. Obviamente não irei fazer comparações de superioridade entre logotipo e mascote pois a diferença entre ambos garante a existência de cada um na estratégia de marca.


    Logotipo e mascotes das Olimpíadas na China

    Pesquisas demonstram que produtos que utilizam personagens mesmo com preço 15% superior ao similar sem personagem, podem vender 30% ou 40% mais, segundo Bonfá e Rabelo (2009) quando o público alvo é infantil. A capacidade cognitiva da criança ainda não está desenvolvida o suficiente para responder a logotipos e a discursos de valores, entendo melhor a imagens que despertam reações emocionais mais imediatas. Lembrando que as crianças não são as únicas atingidas pelo branding com mascotes, tendência natural, pela maioria esmagadora de personagens lúdicos usados. Mulheres também uma vez que, como mães, são as decisoras da compra dos filhos até uma faixa de 8 anos mais ou menos e influenciadoras até o início da adolescência. Elas também respondem a mascotes no segmento de produtos para o lar, como alimentos e produtos de limpeza. Atribuo as respostas desses dois segmentos aos mascotes pela conexão emocional mais presente do que o masculino adulto.



    Tipos

    Para Brée e Cegara (1994) existem dois tipos de mascotes: os de propaganda e os de branding. No primeiro caso, os mascotes são usados na promoção do produto** via a associação de ambos. Aqui a utilização de personagens de terceiros é muito comum através do licenciamento. Prós na utilização de personagens de outras empresas reside eliminação do processo de desenvolvimento da figura e no seu poder de reconhecimento pelo público (visibilidade), eliminando investimentos em ambos os casos. Contras estão na série de limitações (tempo, regras de utilização) definidas pelos donos da personagem e a não composição como um ativo intangível do contratante, fator de relevância pois estes são componentes fundamentais na valorização de uma marca.

    Ex: Turma da Mônica em fraldas e Batman em mochilas.

    Já no segundo caso, branding, são parte da criação do produto normalmente sendo criados especificamente e sendo de propriedade da dona da marca.

    Ex: o mascote da Assolan e mascote de Olimpiadas.


    Mascotes

    Bonfá e Rabelo (2009) avaliam personagens verificando a sua eficácia com base no sistema de avaliação Y & R, chamado Brand Asset Valuator. Levam em conta dois fatores:
    1. A relevância que o personagem tem para o seu público alvo;
    2. O reconhecimento que o público tem do personagem.
    Relevância x Conhecimento

    Pelo gráfico acima vemos que personagens novos são pouco relevantes e conhecidos não possuindo relação com o público alvo. Caso sejam conhecidos, mas de relevância baixa, significa que não está sendo bem cuidados. Os de nicho tem importância alta para o público alvo mas são pouco conhecidos pelo geral. Personagens fracos estão no caso de reconhecidos mas sem importância. E o caso ideal de relacionamento intenso com o consumidor onde é muito conhecido e tem bastante importância.

    Desenho

    O estilo do desenho do mascote está relacionado a estratégia da marca (e, no final das contas, ao público alvo). Mas porque a maioria dos mascotes tem um estilo lúdico, quase infantil tipo cartum, mesmo para produtos do segmento masculino adulto, como copa do mundo? Segundo McCloud (2005) o ser humano possui uma escala de auto-identificação pictórica onde, quanto mais simplificada a representação humana, maior é o segmento humano afetado (sexo e faixa etária)

    Abstração da figura humana

    Acima, a primeira imagem (esquerda para direita) é mais aceita para pessoas parecidas com a da fotografia, ou seja, o segmento de homens adultos, de cabelos pretos e sobrancelhas espessas. Á medida que o traço vai simplificando, mais segmentos se identificam com a figura até o ultimo estágio, onde a identificação é com qualquer ser humano. Ao eliminar detalhes, focando no essencial, o espectro daqueles que se reconhecem na imagem, se amplia. Esta simplicidade se estende ao vestuário e as cores também. As roupas, o mínimo possível para representar o conceito escolhido e as cores, vivas e chapadas no menor numero possível. Outra vantagem dessa abordagem simplificada recai nos meios de reprodução dos mascotes, tanto no meio impresso, quanto digital (animações comerciais).

    Um bom mascote deve então:
    1. Possuir personalidade - representada pela postura física, cabelo e olhos;
    2. Ter cores vivas;
    3. Ter traços simples - quanto mais sinuosos são os traços, mais infantil se torna a figura. Traços mais angulosos adequam-se a imagens mais adultas;
    4. Ser estilizado - diferenciando da imagem similar da realidade;
    5. Estar em sintonia com a estratégia da marca.


    Zakumi, o mascote da Copa da África


    * Segundo Lindstrom, um mascote funciona como um "Marcador Somático", um atalho cerebral usado na hora da decisão baseado em associações emotivas, elemento fundamental no "share of heart".


    ** Por produtos entendam-se serviços e eventos também.



    Bibliografia


    - BONFÁ, Sebastião e RABELO, Arnaldo. Licensing, Como utilizar marcas e personagens para agregar valor aos produtos - M. Books, 2009.
    - BREE J. e CEGARRA J.J. Les Personages , Elements de Reconnaissance des Marques par les Enfants, Revue Française du Marketing n. 146, p. 17-35, 1994
    - LINDSTROM, Martin. A Lógica do Consumo - Editora Nova Fronteira, 2009.
    - McCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. M.Books, 2005.
  15. Herman Faulstich

    Fui um pouco de notícia II

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    Colaborador da LG há pouco mais de 3 anos, Herman Faulstich, teve uma trajetória profissional movimentada. Mesmo antes de se formar, em Desenho Industrial na UFRJ, no ano de 2000, trabalhou na Politec do Rio de Janeiro, reformulando o site do INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) e formulários para a Caixa Econômica Federal.

    "Após o término do contrato montei um escritório de design com 2 sócios em Niterói (RJ), na época da 'bolha da internet' onde atuávamos com design gráfico e web design. Chegamos a ter clientes como Zélia Duncan (site) e GNT-Rede Globo (material impresso)", relembra. Logo depois, Herman migrou para a área de engenharia de software, em Brasília, trabalhando na empresa Cast T.I.. "A empresa necessitava de um profissional que cuidasse da padronização das interfaces dos projetos pois a taxa de rejeição dos clientes era grande. Ele garante ainda que esse foi o maior projeto do qual participou, onde coordenou uma célula com 3 web designers, devido ao grande número de telas (mais de 2.000). "Umas das dificuldades deste projeto, na minha área em específico, foi tornar algumas funcionalidades acessíveis a deficientes visuais. Isso exige um trabalho cuidadoso tanto em interface quanto em código", explica.



    Decidido a diversificar sua experiência, aceitou uma oferta de trabalho em Novo Hamburgo (RS) para trabalhar como analista de requisitos de uma empresa. "Era uma empresa nova e necessitava de alguém com experiência em trabalhar sob a metodologia RUP que a Cast, como parceira Rational, oferecia. Lá participei dos projetos Portal de Fornecedores (Empresas Randon) sistema de gerenciamento de qualidade e Tele Campo (AGCO - Massey Ferguson) sistema gerenciador de atividades da equipe de marketing", acrescenta.

    Em 2006, Herman mudou-se para Goiânia e começou a trabalhar na LG-GO. Ele explica que foi contratado para auxiliar na criação de uma disciplina de usabilidade. "Minha participação mais visível foi na concepção e projeto de usabilidade do portal Myway", destaca. Atualmente, nosso entrevistado está participando da concepção da Nova Geração de produtos da empresa, trabalhando com escopos de produtos e funcionalidades, projetos de interfaces, no departamento de Gestão de Produtos.

    Para o futuro, esse paulistano pretende escrever um livro, conhecer a Europa, concluir seu MBA em Marketing e atuar mais nas dinâmicas entre consumidor e software.

    PING-PONG

    O que me diverte: ser humano.
    O que me irrita: ser humano.
    Família: referência.
    Trabalho: oportunidades.
    A cidade de Goiânia: surpresa.
    Brasil: diverso.
    Nota 10: filé à parmegiana
    Nota 0: engarrafamento
    Esporte: trekking
    Time: Flamengo
    Livro: O Lobo da Estepe
    Ídolo: meu pai
    Uma mensagem:A vida é como uma peça de teatro. O segredo está em saber as suas falas, respeitar os outros atores e fazer uma boa saída” Revista MAD

    Fonte: LG Informa - 2009
  16. Herman Faulstich

    Fui um pouco de notícia

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    Marcello Porto assume novo departamento de gestão de produtos da LG Informática

    O executivo será responsável pela área recém implantada, que tem como objetivo criar inovação na oferta de produtos e atender a demanda de mercados até então pouco explorados, como o de pequenas e médias empresas.

    São Paulo – A LG Informática, maior empresa brasileira especializada em software para RH, escolheu Marcello Porto para assumir o novo departamento de gestão de produtos. O executivo atua na empresa há oito anos e, desde 2005, ocupava o cargo de gerente de Planejamento. Em sua nova função, Porto terá como objetivo colaborar com a inovação das atuais soluções da LG Informática e com a criação de novos produtos demandados principalmente por mercados pouco explorados.

    Formado em Ciências da Computação, com Extensão em Negócios e Pós-Graduação em Gestão Empresarial, juntamente ao analista de inovação, Herman Faulstich, Marcello Porto terá entre as suas principais missões no novo departamento, planejar o modelo de oferta SaaS (software as a service) da LG Informática. “Além de criar inovação em nossas ofertas de produtos e procurar destacar-se de uma maneira diferenciada nesse mercado bastante competitivo, já estamos trabalhando na modelagem, com o intuito de definir como ofereceremos os softwares da empresa como serviço. O objetivo da iniciativa é atingir mercados que até então eram pouco explorados, como o de pequenas e médias empresas”, ressalta Porto.


    Segundo o executivo, o novo departamento de gestão de produtos é uma área estratégica para manter, e ao mesmo tempo, aumentar a competitividade da LG Informática a curto, médio e longo prazo. Entre as responsabilidades e atribuições estão: definição de protótipos, usabilidade e tempo de mercado das soluções, colaboração na definição do projeto de novas soluções, além da elaboração, definição e acompanhamento dos cronogramas. Trata-se de um departamento que atuará paralelamente com todos os outros da empresa. “A LG Informática é dinâmica e precisa estar em constante mudança para corresponder às expectativas de mercado, no que diz respeito à inovação e boa oferta de produtos e serviços. O conceito de uma área como esta é algo totalmente pioneiro. Assim como em tecnologia, a LG Informática é inovadora também na forma de gerir o seu negócio”.

    LG Informática - A LG Informática desenvolve sistemas estratégicos para prover automação de rotinas e auxílio no gerenciamento de pessoal e de recursos humanos para empresas de todos os portes e segmentos. Posiciona-se como a maior empresa brasileira especializada em software para RH, com liderança reconhecida junto às empresas com mais de mil funcionários. As soluções da companhia processam a folha de pagamento de aproximadamente 1 milhão de funcionários em empresas de todo o país. Seu principal produto é o FPw Folha de Pagamento, sistema que, desde seu lançamento em 1994, conquista e amplia o reconhecimento de mercado devido às suas características funcionais e tecnológicas inovadoras e em constante atualização. Com sede e centro de desenvolvimento em Goiás e escritórios em São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Pernambuco, a LG mantém representantes em Minas Gerais e Bahia. Entre os seus clientes, estão AMBEV, Santander, Vale, Unibanco, Oi, Carrefour, Caterpillar, Fiat, Johnson & Johnson, Telefônica, Grupo Positivo, Livraria Saraiva, VIVO, Grupo Votorantim e Rede Globo.

    Fonte: http://www.revistafator.com.br/ver_noticia.php?not=51573
  17. Herman Faulstich

    Dicas para Profissinais de Usabilidade I

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    1- Para não ser chamado de "maquiador de tela" entre outras, você deve ganhar o respeito daqueles que normalmente se referem ao analista de usabilidade assim: programadores e projetistas. Usabilidade bem feita deve levar em conta fatores técnicos restritivos então, estabeleça interação constante com quem vai fazer o sistema no final das contas;

    2- Não fique citando leis de ergonomia ou especialistas da área, prove contextualmente a sua escolha deixando claro os pós e os contras. Sempre existem pós e contras. Prove que os prós superam os contras;

    Obs: os prós que envolvem redução de custo e tempo tem maior peso.

    3- Evite a todo custo o "eu acho…". Todo mundo acha. E o "achado" do cliente ou do seu chefe vale mais do que o seu na pratica. Prove contextualmente a sua escolha deixando claro os pós e os contras. Sempre existem pós e contras;

    4- Escreva uma diretriz de usabilidade, mapeando as situações de interação do usuário com o sistema e as regras de comportamento da tela. Justifique as suas escolhas;

    5- Entenda o publico alvo (vulgarmente chamado de usuário);

    6- Faça protótipos de tela. Ficar explicando como uma tela vai ficar colocando o dedo no monitor não dá. Uma imagem vale mais do que mil palavras (e dedadas na tela);

    7- Saiba vender o seu peixe. Por melhor que seja a sua solução de interface, se você não argumentar bem, perde (e assim te chamam de maquiador de tela).
  18. Herman Faulstich

    Dificuldades da Profissão de Analista de Usabilidade I

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    Usabilidade é contextual pois leis e boas práticas de ergonomia de software:

    a - muitas vezes colidem entre si;

    b - se chocam com limitações técnicas do projeto de software;

    c - esbarram em gostos do cliente, seja por hábito seja por ego;

    d - esbarram em políticagens de outros profissionais e setores da empresa;

    e - são ignoradas e mal compreendidas por pensarem que site da internet é a mesma coisa que sistema web;

    f - são ignoradas e mal compreendidas por pensarem que sistema web tem que se comportar da mesma forma que sistema VB desktop;

    g - são ignoradas e mal compreendidas por pensarem que sistema web são todos iguais;

    h - são ignoradas e mal compreendidas pois o usuário é diferente (normalmente a pessoa tem ela mesma como padrão esquecendo do publico alvo);

    i - são ignoradas e mal compreendidas porque um especialista falou determinada coisa não se observando o contexto da afirmação;

    j - são ignoradas e mal compreendidas porque de médico, louco e analista de usabilidade todo mundo tem um pouco....
  19. Herman Faulstich

    Ergonomia em Engenharia de Software é usabilidade!

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    Usabilidade é o termo pelo qual a ciência chamada Ergonomia de Software é mais conhecida. E a ergonomia, por sua vez, é a área do saber humano destinada ao estudo das relações homem/máquina, focando nas áreas de interação entre ambos (interface). Ao se desenvolver um painel para um carro, uma cadeira de escritório ou o cabo de uma ferramenta, existe um profissional de ergonomia envolvido. Normalmente é um desenhista industrial. Esse profissional é responsável por analisar a relação entre o usuário e o produto, estabelecendo as características necessárias no produto para que ele se adeqüe ao homem. Para a realização desta tarefa exige-se conhecimento de fatores humanos - psicológicos, cognitivos e fisiológicos - e dos meios de produção específicos, já que não adianta nada projetar algo cuja produção ou implementação sejam onerosas ou totalmente inviáveis.

    No caso da engenharia de software, a usabilidade tem seu foco primário na interface gráfica dos programas, visando facilitar ao máximo sua utilização pelo usuário. Essa abordagem se encaixa na prática conhecida como “Desenvolvimento Centrado no Usuário”, um dos pilares do RUP - o framework de processo adotado pela LG.

    RUP: Rational Unified Process® é um processo de engenharia de software. Ele oferece uma abordagem baseada em disciplinas para atribuir tarefas e responsabilidades dentro de uma organização de desenvolvimento.

    Mais informações: http://pt.wikipedia.org/wiki/Rational_Unified_Process

    Focos de atuação

    A usabilidade possui dois focos de atuação: no usuário e no desenvolvimento do software. Em relação ao primeiro, propõe-se a facilitar a manipulação de um programa dispondo os elementos visuais da melhor maneira possível e estabelecendo padrões de comportamento de funções coerentes e repetitivos. Por exemplo, se for definido que um modo de inserção de vários dados em um campo é da maneira X, a cada vez que essa situação se repetir, o procedimento será o mesmo. Com isso a velocidade de utilização do programa aumenta e a curva de aprendizado diminui.



    Quanto ao segundo foco, a usabilidade atua na satisfação de quatro das seis melhores práticas do RUP:

    Desenvolvimento Iterativo – através do protótipo onde uma versão muito próxima da que será entregue ao cliente é visualizada, permitindo levantar possíveis problemas antes do aparecimento dos mesmos na fase posterior de implementação.

    Modelagem Visual – novamente o protótipo é o foco onde se pode remeter à velha máxima de que uma imagem vale mais do que mil palavras. Esse artefato esclarece muito mais rápido o usuário do que a tradicional especificação textual de caso de uso.

    Arquitetura baseada em componentes – quando se definem os padrões de comportamento os mesmos podem ser componentizados facilitando sua aplicação e manutenção. Essa abordagem remete ao desenvolvimento Orientado a Objetos, um dos pilares do RUP.

    Gerência de Requisitos – a usabilidade lida com um tipo de requisitos chamado “não-funcionais”. São requisitos não demandados pelo cliente, mas que podem causar transtorno se não mapeados e acordados com o mesmo.

    Muitas vantagens

    Trabalhar o conceito de usabilidade no desenvolvimento de sistemas permite uma utilização mais fácil do software pelo usuário, além de facilitar a implementação e manutenção do sistema pela equipe de desenvolvimento e diminuir significativamente problemas com requisitos não-funcionais. Esses fatores acabam afetando em prazos de entrega e custos.

    O principal atingido pela usabilidade é o próprio usuário, que tem o seu trabalho facilitado por possuir um software mais fácil de utilizar. Mas a equipe da LG também tem benefícios:

    Gerência/Líderes – o protótipo pode servir como artefato de garantia do acordo/aceite do cliente, pois ali foi aprovada a maior parte da solução. Maior parte, pois requisitos sempre mudam ao longo do desenvolvimento.

    Analista de Requisitos – o protótipo permite que o analista esclareça melhor com o cliente os requisitos, ajudando-o a enxergar melhor suas necessidades, além de antecipar possíveis enganos na especificação antes descobertos apenas na disciplina de Análise e Design.

    Arquiteto/Projetista – com as situações mapeadas e componentizadas junto a um protótipo – o que possibilita uma pré-visualização do que será entregue ao cliente - o arquiteto/projetista tem sua tarefa facilitada, podendo prever melhor os riscos e dificuldades.

    Homologação/Testes – com o protótipo e a diretriz de usabilidade - artefato que contém os padrões das interfaces do sistema -, a homologação tem artefatos suficientes para garantir uma melhor qualidade do seu trabalho.

    Usabilidade na LG

    Herman Faulstich, desenhista industrial formado na Universidade do Federal do Rio de Janeiro, é o responsável pela usabilidade dos produtos da LG Informática. Herman está na empresa desde janeiro deste ano e traz em seu currículo uma vasta experiência na área de design gráfico, webdesign e análise de requisitos, tendo participado de grandes projetos em várias empresas do Rio de Janeiro, Distrito Federal e Rio Grande do Sul. “Primeiro fiz avaliação para a vaga de Analista de Requisitos na LG-RJ, mas como a necessidade para Analista de Usabilidade era maior, fiquei com esse papel e vim para a LG-GO”, recorda Herman.

    (Artigo publicado no site da empresa LG Lugar de Gente em 2007)
  20. Herman Faulstich

    BAUHAUS – Parte III

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    (Artigo escrito para o site X-DESIGN no período de 2000/2002)




    História e Política


    Durante a sua existência, a Bauhaus enfrentou vários problemas de ordem política, pois uma escola com características revolucionária e questionadora, inevitavelmente, acaba gerando polêmicas, e estas atingiram tanto o corpo docente quanto os governos locais.

    No período quer vai de 1919 a 1924, a sede da escola foi na cidade de Weimar. Em 1923 o Conselho Municipal exigiu uma exposição dos alunos, a fim de provar a validade dos investimentos na escola e, além disso, a população via os estudantes boêmios com desconfiança, pois parte da renda da cidade era destinada a custear seus estudos. Infelizmente , a Bauhaus não produzia resultados palpáveis e preocupava a Gropius, o fato dos alunos gastarem mais tempo na teorização do que na produção. Apesar de Gropius preferir esperar um aumento da produção dos seus alunos, a exposição foi realizada. Obteve êxito extraordinário, e fora aclamada pelas críticas da Europa e a América. Com a eleição do Partido Popular da Alemanha, conservador, as acusações contra a Bauhaus penetraram mais nos âmbitos oficiais, principalmente com a associação do partido com o artesanato. A escola rescindiu seu contrato com o Estado de Weimar em 31 de Março de 1925.

    Entretanto, o presidente do Município de Dessau (pequena cidade industrial na região do carvão) Dr. Fritz Hesse oferece abrigo para a construção de uma nova sede para escola. Como meio de custear as obras, houve um acordo com o Município que encomendou três importantes projetos:


    - as próprias instalações da Bauhaus

    - um complexo habitacional

    - uma permuta de trabalho


    Com isso a Bauhaus tornou-se auto-suficiente e elaborou uma série de propostas inovadoras para um extenso número de produtos. O conjunto de casas e edifícios dos mestres, projetados por Gropius, tornaram-se referência da moderna arquitetura alemã.

    Em 1928, Walter Gropius demitiu-se após várias críticas sobre o custo da manutenção da escola, pois estas tornaram-se bastante pessoais, retirando-se ao exercício privado da arquitetura. Quem assumiu a direção foi o arquiteto suíço Hannes Mayer, marxista ativo, leva a escola a abandonar o estilo elitista do antecessor. Mayer levou a escola a uma direção mais técnica em detrimento da abordagem artística. Substitui o artist - designer pelo industrial designer, imbuindo sua visão funcionalista no ensino. O designer passa a se identificar mais com o engenheiro do que com o artista. Os mestres foram substituídos pelos professores. Com sua abordagem social, Mayer faz a Bauhaus produzir mais em favor da demanda popular: habitações e mobiliários de baixo custo, direcionados ao subúrbio de Dessau, programa de construção de móveis populares na criação da Escola Sindical de Bernau. A produção da escola encontra um mercado consumidor mais aberto, coincidindo com a recuperação econômica alemã.

    Porém, as atitudes marxistas de Mayer , chocavam-se com a filosofia política de Dessau, aliando o descontentamento do rumo que a escola tomava , Fritz Hesse o demite e, em seu lugar, assume Ludwing Mies Van de Rohe, por indicação de Gropius em 1930.

    Retomando a filosofia original, a Bauhaus buscava o realismo funcional, perfeição formal e uso de materiais mais nobres. Embora Mies tivesse posto fim as atividades políticas da escola, ela continuou sendo mal vista pelo Partido Nazista. Segundo eles, a Bauhaus patrocinava uma arte degenerada, sem vitalidade e decadente em relação ao "dinâmico espírito alemão". Somados a isso, corriam as críticas às ideologias esquerdistas de membros da escola.

    Em 1932, os nazistas tomaram o poder em Dessau, forçando a escola a mudar-se para Berlim, numa fábrica abandonada de telefones, sob o nome de Instituto Superior de Pesquisa Técnica. Porém, seis meses mais tarde, em Julho de 1933, a Gestapo ocupa a escola.

    Ali se encerrava quatorze anos de atividades artísticas.



    Legado


    Paradoxalmente, foi com o fechamento da escola que sua filosofia difundiu-se internacionalmente. Fugindo do nazismo, professores e estudantes da Bauhaus espalharam-se pelo mundo e transmitindo seus conhecimentos e pensamentos oriundos da escola.

    Walter Gropius foi nomeado diretor da Escola de Arquitetura de Harvard em 1937 e com Marcel Breuer, criou uma empresa privada de arquitetura em Cambridge. Mais tarde em 1946, fundou The Architects Collaborative, empreendimento que serviu para orientar a arquitetura moderna. Moholy - Nagy fundou a New Bauhaus em Chicago. Josef Abers foi lecionar no Black Mountain College, na Carolina do Norte e depois na Escola de Design da Universidade de Yale. Mies Van der Rohe trabalhou no Instituto de Tecnologia de Illinois e Herbert Bayer como diretor artístico, numa agência de publicidade em Nova York, que chegou a ter pelo menos uns vinte graduados da Bauhaus. O reflexo esta nos arrojados arranha-céus da cidade. Outras escolas com o mesmo princípio da Bauhaus foram surgindo, no Japão, Holanda Hungria e Suíça.

    Após a 2ª Guerra Mundial, em 1954, um ex estudante da Bauhaus, Max Bill com a ajuda dos irmãos Scholl, funda a Hochule Für Gestaltung, na cidade de Ulm, Alemanha. Sob a filosofia de que a melhor forma é a que vende mais, a "Gute Form", Bill não conseguiu evoluir no meio industrial. Desgostou o corpo docente com sua estandartilização formal e foi substituido por Tomás Maldonado em 1956. Maldonado substituiu o sistema de ateliers por oficinas de construção de protótipos e laboratórios fotográficos, alegando ser uma involução utilizar os métodos de ensino de 40 anos atrás. A escola preocupou-se em construir a forma de modo a ser totalmente controlável, mensurável e sem qualquer referência visual, valendo-se de um projeto analítico e funcionalista bauhausiano. Em 1968 é fechada por dificuldades financeiras.

    Em 1964, é fundada no Brasil a primeira escola de desenho industrial, a ESDI, na cidade do Rio de Janeiro, seguindo os padrões da Escola de Ulm.

    Em 1993 a Bauhaus é reaberta em Weimar e ,em 1999, alguns estudantes chegam ao Brasil para realizar um estudo de reaproveitamento formal e arquitetônico nas favelas do Rio de Janeiro.



    Herman Faulstich





    Mestres da Bauhaus em 1926. À partir da esquerda: Josef Albers, Hinnerk Scheper, Georg Muche, László Moholy-Nagy, Herbert Bayer,Joost Schmidt, Walter Gropius, Marcel Breuer, Wassily Kandinsky, Paul Klee, Lyonel Feininger,Gunta Stölzl, Oskar Schlemmer.

  21. Herman Faulstich

    BAUHAUS – Parte II

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    (Artigo escrito para o site X-DESIGN no período de 2000/2002)




    Filosofia de Ensino


    Na Bauhaus, coexistiam o pensamento artístico - filsófico e o técnico - industrial. O objetivo da escola era formar o profissional imbuído dessas características e crítico o suficiente para adapta-los a qualquer projeto. Segundo Gropius: "O projeto de um grande edifício e o de uma simples cadeira diferencia-se apenas na proporção, não no princípio".

    O currículo era dividido em sete materiais: metal, madeira, argila, pedra, têxteis, cor e vidro. Para estudar as relações de formas e chegar a soluções gerais, dividia-se a abordagem em três:

    - observação - onde seria estudado a natureza e a análise de materiais

    - representação - definida como estudo de técnicas de construção, desenho técnico, desenho de projetos, geometria descritiva e desenvolviemento de modelos.

    - composição - onde se estudava a teoria das cores, das formas e do desenho.

    O aprendizado começava com a permanência, por um período de seis meses, na Oficina do Principiante, que tinha por objetivo liberar os alunos de preconceitos artísticos e encoraja-los a buscar novas soluções nas questões do design. Após esse período, seguiam-se três anos de rigoroso aprendizado num ofício à escolha do estudante ( artes gráficas, marcenaria, cenografia, gravura, cerâmica ou tecelagem). Os cursos eram ministrados conjuntamente por um artista e um técnico, onde o aluno empenhava-se em chegar a uma solução estética funcional , na melhor maneira possível de ser fabricada em série, que segundo Gropius deveria ser "clara e orgânica, despida de quaisquer disfarces ou artifícios". A forma do objeto, primeiramente deveria ser determinada pela sua função e em seguida pelas conveniências da produção mecânica. Simultaneamente às práticas da oficina, o aluno estudava geometria, desenho, teoria das cores, composição e materiais.

    Após esse período, o aluno prestava um exame perante os mestres da escola e técnicos das oficinas para receber a "carta de oficial da Bauhaus". Para aqueles que que desejassem prosseguir com os estudos, começava a fase do estágio nas áreas de construção, por exemplo em indústrias,canteiros de obras e cursos complementares como engenharia, desenho técnico e materias de fabricação. Concluída essa fase, o aluno recebia o título de Mestre da Bauhaus. A formação não era específica , pois os alunos saíam, de acordo com a sua vocação, desenhistas, arquitetos, projetistas ou professores.

    O que diferenciava a Bauhaus ( e teoricamente hoje, qualquer curso superior) era a capacidade de produzir massa crítica. Indivíduos que colaborariam para a evolução da sociedade e do país, na sua especialidade.

    A solução dos problemas da forma mais simples possível, era um dos objetivos do curso. Certa vez Josef Albers, pintor de renome e professor na Oficina do Principiante, pediu aos seus alunos que construíssem com jornais velhos, "algo mais do que têm nesse momento", sem utilizar cola ou tesoura. Desejando-lhes sorte, saiu da sala. Ao voltar ali estavam uma série de trabalhos dos alunos representando figuras, barcos, aviões, animais, que classificou como "produtos de jardim-de-infância que teriam sido melhor executados com outros materiais". Apenas um aluno (ex-estudante de arquitetura) havia chegado a uma solução que agradou o professor: ele dobrou a folha ao meio, colocado-a em pé. Albers explicou que o jornal, normalmente, sem rigidez e com "ar indolente" apenas visível de um dos lados, quando largado em uma superfície, apresentava-se agora firme e direto sobre as suas finas extremidades, permitindo assim a leitura de ambos os lados. O problema fora solucionado de forma simples. Outras experiências semelhantes utilizando madeira, arame, metal e fósforos, faziam despertar nos alunos originalidade e espontaneidade na solução dos problemas, mais tarde levados no desenvolvimento de projetos.



    Tipografia






    Seguindo a filosofia da simplicidade na resolução dos problemas formais, a Bauhaus inovou radicalmente também na tipografia. Visava uma comunicação efetiva e limpa de floreios e excessos no design dos tipos, criando as fontes sem serifas.Matéria muito importante em Dessau, o estudo das letras possuia duas disciplinas no curso introdutório. Destacaram-se no estudo Laszlo Moholy Nagy e Herbert Bayer.

    Nagy criou a teoria de construção de fontes e seu ensino didático, que foram publicados no livro, "Staatliches Bauhaus in Weimar 1919-1923", onde lançava o pensamento da clareza e objetividade no desenvolvimento de um alfabeto gráfico: "Tipografia é um instrumento de comunicação. Ela deve comunicar claramente e da forma mais urgente possível".

    Herbert Bayer, estudante e mais tarde professor da Bauhaus, possuia as mais radicais opniões sobre o assunto. Detestava o uso das serifas, que achava desnecessárias assim como as capitulares: "Nós não falamos em maiúsculo ou minúsculo", refletia no livro Bauhaus 1919 -1928. Argumentava que possuindo apenas um tamanho, o uso das fontes seria mais fácil. Em 1925, a Bauhaus parou de usar as maiúsculas em seus textos. No período entre 1925 - 27, Bayer criou a fonte "Universal" e passou a trabalhar apenas usando papeis da Deutschen Normenausschuss ( Comissão Alemã de Norma, que serviu de base para para as normas brasileiras e é utilizada quando um assunto está omitido) e reduzindo seu espectro de cores a apenas dois: preto e vermelho.

    Esbarrando no conservadorismo alemão (o uso das letras góticas era característica do povo germânico), as alterações das fontes não foram bem vistas, tanto pelo povo quanto pelas autoridades do país. A irritação ficou ainda maior quando a Bauhaus deixou de usar as capitulares. Uma peculiaridade da língua alemã, é que todo substantivo tem sua primeira letra maiúscula e, como na maioria das línguas, o alemão também usa no início dos nomes próprios e no início das orações. Para efetivar essa mudança, teria que haver uma alteração no comportamento social e gramático, o que seria difícil numa sociedade conservadora do tipo da alemã. Entretanto, foi esse radicalismo filosófico que definiu o comportamento da Bauhaus perante a história.

    Junto das fontes aserifadas, a Bauhaus, na parte gráfica, valia-se da geometrização das formas. Com inspiração construtivista, o uso das formas agudas acompanhava a tendência projetiva dos objetos, juntamente com a adição de linhas guia e pontos nas formas.




  22. Herman Faulstich

    BAUHAUS – Parte I

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    (Artigo escrito para o site X-DESIGN no período de 2000/2002)




    "O artista esta vivendo numa era de dissoluções e está desorientado. Está isolado. Os velhos padrões estão em ruínas, o mundo entorpecido está sendo sacudido, o velho espírito humano está ultrapassado e caminhando em direção a uma nova definição. Nós flutuamos no espaço e ainda não percebemos a nova ordem."


    Walter Gropius


    Símbolo de modernidade e revolução, a Bauhaus foi uma instituição inovadora que no início do século determinou o comportamento do design e da arquitetura. Colocando a Alemanha como precursora da arte moderna, a Bauhaus influenciou o sistema de ensino e produção mundiais, definitivamente, como disse Marcel Breuer, "civilizando a tecnologia".


    Origem

    No final do século, o mundo encontrava-se sob o período Racionalista, onde os ornamentos da evolução construtiva, entravam em choque com a produção industrial, somados a isso, o advento do fim de século, que inspira mudanças radicais na filosofia e comportamento humanos.

    O arquiteto Adolf Loos formulou um ensaio sob o título de "Ornamento é crime", onde plantava a semente do pensamento funcionalista que teve reflexo na filosofia de outro arquiteto, o americano Louis Sulivam, que caracterizou o seguinte pensamento crítico : "A forma segue a função".

    Em 1890 com o advento do Art Noveau, do belga Henry van de Velde, surge a afirmação de que a busca pela ornamentação da forma, deve desenvolver uma expressão atualizada com as necessidades características da época, e não com base em conceitos passados. A substituição da mão-de-obra agrícola pela industrial, gerava novos paradigmas a serem estudados, tais como adaptar a necessidade de expressão artística com a de bens de consumo e produção, com a nova forma de produção em série.

    A Alemanha pós-guerra, serviu de cenário perfeito para a aplicação e estudo destes conceitos: um país destruído pela guerra, incentivava artistas e intelectuais a reconstrui-lo, através de novas idéias e soluções adequadas à produção industrial, já fortemente implantada.

    Na cidade de Darmstald em 1899, Peter Behrens e o austríaco Joseph Maria Olbrich, fundam a Colônia Mathidenhoele. Behrens é considerado o primeiro desenhista industrial, pois suas criações pendiam mais para a técnica do que para a arte, seguindo a filosofia da melhor aplicação na produção industrial. Henry van de Velde chega à Alemanha em 1902, sob contrato da cidade de Weimar e atua como conselheiro artístico da Escola de Arte local. O seu atelier foi denominado Seminário de Arte Industrial, que originou em 1906 a "Nova Escola de Arte Industrial de Weimar". Com o advento da Primeira Guerra mundial, o seu trabalho foi interrompido.Em 1907 na Prússia, Hermann Muthesius inaugurou a Escola Deutsche Werkbund, que tinha por objetivo unir as maiores expressões da indústria, comércio e arte afim de somarem esforços para conseguir uma maior qualidade na produção industrial, visando o comércio e competição de mercado.

    Sob esse cenário, na primavera de 1919, na cidade de Weimar, é fundada a Bauhaus. Tendo como diretor e fundador o arquiteto alemão Walter Gropius (indicado por Van de Velde), a escola abrigava os maiores artistas e arquitetos do país. Levado sob o pensamento funcionalista, Gropius buscava a integração da arte, e conhecimentos artístico e formais, com os processos industriais.

    A escola seguia a filosofia de não possuir um estilo característico, pois obedecia a relação função/materiais que, de acordo com cada projeto, culminava em uma solução própria. Gropius pensava que a forma dos objetos deveria desenvolver-se a partir dos materiais utilizados, tal como uma flor se desenvolve a partir de um bulbo, e que deviam ser "regidos pela existência de sua própria lei", e não por obediência a um código de estética fixo. Tentou fazer com que o artesão adapta-se as novas técnicas de produção, prevendo que ele seria o futuro coordenador da produção industrial. No entanto, erra pois, o artesão tornou-se o operário, e o outro mais inteligente e preparado tornou-se o desenhista industrial.
  23. Herman Faulstich

    A Revolução da Maçã

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    (Artigo escrito para o site X-DESIGN no período de 2000/2002)




    Em muitas histórias e lendas, a maçã foi responsável por mudanças significativas nas situações presentes: na Bíblia, depois de morder a dita fruta, Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, tendo que viver em um novo mundo, Branca de Neve ao morder uma, foi enfeitiçada, caindo num sono mágico. Na informática, algo parecido acontece: uma maçã surgiu para mudar as coisas definitivamente.



    A Apple sempre foi conhecida por lançar tendências e revolucionar o mundo dos microcomputadores. Foi o primeiro micro caseiro (o Apple II de 1977), numa época em que a informática estava restrita as grandes corporações e universidades. Foi a primeira a lançar no mercado a interface gráfica e o mouse, com o micro Macintosh em 1984. Curiosamente não os projetou, emprestou o sistema da Xerox, que não via nenhuma aplicação prática ou validade significativa (além do que, associar a imagem da empresa a um aparelho chamado "rato" não pegaria bem). Ironicamente, seu fundador, Steve Jobs, repetiu o erro da Xerox, ao entregar o sistema para uma empresa de fundo de quintal, chamada Microsoft ( achando que na época o verdadeiro perigo era a IBM) .

    O Macintosh virou sinônimo de computação gráfica e estabilidade. Apesar da qualidade inferior, os "micros da janela" tornaram-se os campeões de venda e alcançaram popularidade mundial, instalando definitivamente o conceito de computadores pessoais na vida do cidadão comum , reservando aos produtos da Apple, um público mais reduzido, composto principalmente de profissionais das áreas gráfica e digital, e gerando um fanatismo pela marca impar no mundo (a macmania).

    Na década de 90, a Apple amargou uma queda de vendas, perdendo para a Microsoft o posto de líder no mercado. Nesse período Steve Jobs é demitido da sua empresa. Steve Wozniac (o co-fundador) saiu antes.

    No ano de 1998, após a volta de Jobs ao comando da empresa, a Apple lança um produto que a tirou definitivamente do buraco: o iMac. Até então, os micros obedeciam a velha formula : gabinetes quadrados e monitores-televisão-beje. O máximo de alteração foi um ou outro que apareciam pretos .




    Pensando Diferente



    No entanto, nada disso nublou o sucesso do produto, que abriu caminho para mais mudanças seguindo essa tendência. Numa jogada de gênio, a Apple associou as cores dos micros a uma marca gustativa, relacionando a variedade de modelos a "sabores", fortalecendo o sentido através da onomatopeia "Nham!". Outra dentro foi a fantástica séria de anúncios "Think different", onde gênios da história recente aparecem em fotos preto e branco apenas com essa frase e o logo da empresa. Em 1999, a Apple lançou o iBook, a versão notebook do iMac, igualmente um sucesso de vendas seguindo o mesmo conceito de design que agora parece padrão para todos os micros da empresa. Ao mesmo tempo, lançou o Power Macintosh G4, no mesmo material e com uma potência que o levou a ser considerado pelo governo norte-americano, como o micro mais rápido do mundo, por executar pelo menos 1bilhão de operações de cálculos por segundo, inaugurando a medida de velocidade "gigaflop" (aposentando o "megahertz"). Para se ter uma idéia da velocidade da máquina, um G4 500 MHz chega a ser 3 vezes mais rápido que um Pentium III 600MHz. O grande destaque fica pelo monitor de tela plana de 17". A Apple conseguiu aliar a mudança no design, com a evolução dos componentes internos, fortalecendo a marca no mercado



    Um dos mais recentes lançamentos foi o Air Port, um modem externo para conexão em rede, um tipo de gerenciador que facilita muito a vida de varias pessoas que necessitam usar a internet ao mesmo tempo. Usando as cores frias características do G4 e uma forma mais orgânica que os lançamentos anteriores (inclusive fica difícil saber o que é ao se olhar de primeira), esse novo lançamento não possui o mesmo enfoque comercial do iMac, mas segue com sucesso o seu estilo.






    Sabor ao Cubo




    Por último, a Maçã lançou no dia 19 de Julho, na MacWorld, mais um produto que nos fez ficar com mais raiva ainda do nosso querido PC, o G4 Cube. Dessa vez Jobs veio com uma overdose de mudanças comparáveis apenas as do iMac: reduziu a CPU a um cubo de aresta 20 centímetros, silencioso, pois usa um sistema de ventilação sem ventilador, alterou a localização do drive do CD, agora em cima com entrada na vertical para o disco, implementou o mouse óptico, sem botões e sem a bolinha, que funciona se pressionado em qualquer parte de sua superfície, caixas de som esféricas e o monitor de 22 polegadas, tela plana, o maior do mercado. Seguindo os mesmos padrões de cores do modelo anterior (gelo e azul), o Cube chega para inovar o conceito de espaço em áreas de trabalho, seguindo uma tendência mundial de que, em breve, só existirá um fator de restrição no projeto de aparelhos eletrônicos: as medidas ergonômicas do próprio homem.

    Aqua

    Não só os designers de produto tiveram trabalho, a Apple também alterou a sua simbologia em função do lançamento do iMac, pricipalmente adaptando-a ao seu material translúcido. O seu logotipo da maçã, antes colorido, agora é monocromático nos periféricos. A mudança não só adapta o logo ao novo material, como também reflete o novo comportamento da empresa, de (re) evolução e adaptação aos novos tempos. E pegando carona, os ícones dos softwares também sofreram alterações, como os do Internet Explorer e Quicktime, semelhante ao site,todo em padrões translúcidos. É interessante notar a diferente aplicação das cores nos hardwares da empresa: enquanto o iMac possui um espectro de cores mais diverso, com enfoque em cores fortes e alegres, que o direciona a um público mais amplo e antes não visado pela empresa ( jovens , mulheres e até crianças), a linha G4 possui cores mais frias, remetendo a um público mais específico e tecnológico (estudantes universitários, universidades, agências de publicidade, escritórios de design, etc.)





    Os designers gráficos saíram-se muito bem com a interface do novo sistema operacional da empresa, o Mac OS X. Batizada de "Aqua", a interface não é nada menos do que impressionante: os botões parecem bolhas d'agua coloridas pulsantes, o mesmo com os dos scrolls, os menus de sub-opções são transparentes. Na parte inferior do monitor fica um "Dock" em que pode ficar até 128 itens diferentes ( janelas minimizadas, pastas, links para sites na internet, etc.) A dinâmica da abertura de pastas também mudou, agora elas são "sugadas" ao fechar.



    A indústria aderiu em peso às estripulias da Apple: o número de periféricos de plástico translúcido aumentou, estão surgindo PCs do mesmo material, incentivando a produção e renovação desses artigos, como disse Jobs: "nós colocamos o mercado em movimento" (mais novidades para copiarem, na mesma MacWorld, foram lançados os iMacs snow, ruby, índigo, grafite e sage). Infelizmente nenhum PC ainda chegou perto da beleza e da funcionalidade dos projetos da Apple.
    As tímidas tentativas de cópia estão surgindo a todo momento, e nos resta esperar alguma que vingue, por isso aconselho: se você NÃO tem nenhum periférico da Maçã, NÃO procure saber nada, NÃO entre no site da Apple, afaste-se de qualquer imagem do Aqua, nem leia artigos sobre o assunto, vai ser duro voltar para o seu micro-beje-televisão-sistema-operacional-padrão.

    Vai por mim.


    Herman Faulstich

    (Herman Faulstich acredita que ninguém torna-se um designer mais competente por possuir um Mac, mas que fica muiiiito menos triste em gastar o seu dinheiro em um, fica)

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